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Ser de esquerda é não aceitar as injustiças, sejam elas quais forem, como um fato natural. É não calar diante da violação dos Direitos Humanos, em qualquer país e em qualquer momento. É questionar determinadas leis – porque a Justiça, muitas vezes, não anda de mãos dadas com o Direito; e entre um e outro, o homem de esquerda escolhe a justiça.
É ser guiado por uma permanente capacidade de se estarrecer e, com ela e por causa dela, não se acomodar, não se vender, não se deixar manipular ou seduzir pelo poder. É escolher o caminho mais justo, mesmo que seja cansativo demais, arriscado demais, distante demais. O homem de esquerda acredita que a vida pode e deve ser melhor e é isso, no fundo, que o move. Porque o homem de esquerda sabe que não é culpa do destino ou da vontade divina que um bilhão de pessoas, segundo dados da ONU, passe fome no mundo.
É caminhar junto aos marginalizados; é repartir aquilo que se tem e até mesmo aquilo que falta, sem sacrifício e sem estardalhaço. À direita, cabe a tarefa de dar o que sobra, em forma de esmola e de assistencialismo, com barulho e holofotes. Ser de esquerda é reconhecer no outro sua própria humanidade, principalmente quando o outro for completamente diferente. Os homens e mulheres de esquerda sabem que o destino de uma pessoa não deveria ser determinado por causa da raça, do gênero ou da religião.
Ser de esquerda é não se deixar seduzir pelo consumismo; é entender, como ensinou Milton Santos, que a felicidade está ancorada nos bens infinitos. É mergulhar, com alegria e inteireza, na luta por um mundo melhor e neste mergulho não se deixar contaminar pela arrogância, pelo rancor ou pela vaidade. É manter a coerência entre a palavra e a ação. É alimentar as dúvidas, para não cair no poço escuro das respostas fáceis, das certezas cômodas e caducas. Porém, o homem de esquerda não faz da dúvida o álibi para a indiferença. Ele nunca é indiferente. Ser de esquerda é saber que este “mundo melhor e possível” não se fará de punhos cerrados nem com gritos de guerra, mas será construído no dia-a-dia, nas pequenas e grandes obras e que, muitas vezes, é preciso comprar batalhas longas e desgastantes. Ser de esquerda é, na batalha, não usar os métodos do inimigo.
Fernando Evangelista

quinta-feira, janeiro 12, 2012

Uma eleição sem esperança. Mas com dinheiro

 

Do Viomundo ,no excelente texto da sensível Heloísa Vilella, sobre as desenxabidas eleições americanas, num clima totalmente diverso daquele que, há quatro anos, embalou nossas esperanças de uma nova ordem mundial.
Desânimo com processo político marca prévias nos EUA
Algo ficou muito claro depois da consulta no estado  de Iowa e das primárias em New Hampshire, ao menos para mim, não foi o  favoritismo do ex-governador de Massachusetts, Mitt Romney, ou da força  dos independentes, representados pelo deputado texano Ron Paul. O que  veio à tona, com força, foi o desânimo geral com o processo político nos  Estados Unidos. E dessa vez, dos dois lados da briga.
Há quatro anos, quando surgiu um senador novato,  negro, com um perfil diferente o suficiente para provocar curiosidade,  ódio e paixão, havia no ar um que de esperança. De vontade de participar  e acreditar que a democracia é um processo representativo onde quem  quer ter voz é ouvido. Foi um momento, agora, distante na memória do  eleitorado geral. Quatro anos depois, não existe nada parecido.
Esta é a primeira eleição presidencial em que  vigora a decisão da Suprema Corte americana, de janeiro de 2010,  conhecida como “Cidadãos Unidos”. Somente no país onde candidato a  presidente diz que empresa também é gente, essa decisão poderia ter  título tão enganador. Ela permite que as empresas invistam o quanto  desejarem em propaganda política. Autoriza a criação dos Comitês de Ação  Política, grupos que levantam dinheiro para produzir e divulgar  material de campanha em favor deste ou daquele candidato. E,  principalmente, contra os adversários.
Foi o que aconteceu em Iowa. Os grupos  comprometidos com a campanha de Mitt Romney inundaram as tevês locais de  anúncios para atacar diretamente o ex-deputado Newt Gingrich. Assunto  não falta. Entre outros problemas, ele deixou o Congresso em 1999,  depois de ser repreendido e multado pelo comitê de ética da Câmara.  Milagrosamente, ressuscitou politicamente e está dando o troco esta  semana. Com um aporte de US$ 5 milhões de dólares de um empresário do  jogo, em Nevada, depositado em um desses Comitês de Ação Política, já  está no ar a propaganda contra Romney.
Então, é assim. Com muito dinheiro para gastar, um  tenta acabar com a imagem do outro enquanto o Presidente Barack Obama  assiste a tudo, provavelmente, sorridente. Essa luta intensa entre os  republicanos é capaz de destruir os aspirantes a candidato a presidente.  Mas não está sendo capaz de entusiasmar as bases. Eu me lembro do  entusiasmo que transbordou nas ruas aqui de Manchester, New Hampshire,  há quatro anos. O “fator Obama” realmente mobilizou os eleitores, dos  dois partidos. Agora, entre os democratas, existe um sentimento de  frustração, de decepção, inegável.
A mudança que se esperava não veio. Os  republicanos, empurrados ainda mais para a direita pelos radicais do Tea  Party (Sarah Palin, etc.), tentam encontrar alguém “elegível” para  enfrentar Obama, mas os eleitores não estão entusiasmados com as  opçõesdisponíveis. Com certeza, no momento, já se pode prever um  resultado em novembro: baixíssimo índice de comparecimento às urnas.
E mais. Quem saiu de casa para dormir em praça  pública nas várias vilas improvisadas do movimento Occupy, não está nem  um pouco interessado nesse processo político. Nessa democracia com  regras estabelecidas pelo e para o poder do dinheiro. Quanto mais  dinheiro as empresas investem na produção e eleição de seus candidatos,  menos a população se interessa e participa.
A única cédula eleitoral realmente interessante que  encontrei aqui em New Hampshire me foi oferecida no acampamento do  Occupy local e nos postos de votação das primárias. Ela é longa. São  onze perguntas ao todo. Entre elas, se os Estados Unidos deveriam fechar  as mais de 850 bases militares que mantém em outros países. Como  deveriam investir o dinheiro economizado, como garantir tratamento  médico para a população, como regulamentar a participação do dinheiro na  política ou simplesmente eliminar a presença financeira de uma vez,  etc.  A cédula está aqui.
A votação continua, ao vivo ou pela internet. E  este grupo, que continua ocupando as praças do país, está mais  preocupado com esta votação e nada interessado nos candidatos,  republicanos ou democrata, que vão torrar milhões e milhões de dólares  na briga pela Casa Branca
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*Tijolaço

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