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Ser de esquerda é não aceitar as injustiças, sejam elas quais forem, como um fato natural. É não calar diante da violação dos Direitos Humanos, em qualquer país e em qualquer momento. É questionar determinadas leis – porque a Justiça, muitas vezes, não anda de mãos dadas com o Direito; e entre um e outro, o homem de esquerda escolhe a justiça.
É ser guiado por uma permanente capacidade de se estarrecer e, com ela e por causa dela, não se acomodar, não se vender, não se deixar manipular ou seduzir pelo poder. É escolher o caminho mais justo, mesmo que seja cansativo demais, arriscado demais, distante demais. O homem de esquerda acredita que a vida pode e deve ser melhor e é isso, no fundo, que o move. Porque o homem de esquerda sabe que não é culpa do destino ou da vontade divina que um bilhão de pessoas, segundo dados da ONU, passe fome no mundo.
É caminhar junto aos marginalizados; é repartir aquilo que se tem e até mesmo aquilo que falta, sem sacrifício e sem estardalhaço. À direita, cabe a tarefa de dar o que sobra, em forma de esmola e de assistencialismo, com barulho e holofotes. Ser de esquerda é reconhecer no outro sua própria humanidade, principalmente quando o outro for completamente diferente. Os homens e mulheres de esquerda sabem que o destino de uma pessoa não deveria ser determinado por causa da raça, do gênero ou da religião.
Ser de esquerda é não se deixar seduzir pelo consumismo; é entender, como ensinou Milton Santos, que a felicidade está ancorada nos bens infinitos. É mergulhar, com alegria e inteireza, na luta por um mundo melhor e neste mergulho não se deixar contaminar pela arrogância, pelo rancor ou pela vaidade. É manter a coerência entre a palavra e a ação. É alimentar as dúvidas, para não cair no poço escuro das respostas fáceis, das certezas cômodas e caducas. Porém, o homem de esquerda não faz da dúvida o álibi para a indiferença. Ele nunca é indiferente. Ser de esquerda é saber que este “mundo melhor e possível” não se fará de punhos cerrados nem com gritos de guerra, mas será construído no dia-a-dia, nas pequenas e grandes obras e que, muitas vezes, é preciso comprar batalhas longas e desgastantes. Ser de esquerda é, na batalha, não usar os métodos do inimigo.
Fernando Evangelista

quinta-feira, março 13, 2014

GOLPE DE 64: REVOLUÇÃO PARA QUEM?


Chico Vigilante
CHICO VIGILANTE
Para os que tramaram e derrubaram João Gloulart para garantir os interesses americanos no país, com o apoio dos mesmos que hoje criticam as medidas dos governos petistas pelo fim das desigualdades sociais no Brasil e na América Latina
Há 50 anos o Brasil passou por uma experiência nefasta, que atrasou por décadas o desenvolvimento social do país e as reformas em andamento em 1964.
Neste mês, alguns cidadãos reunidos em clubinhos e sites de extrema direita devem estar se preparando para comemorar o 31 de março, sem perceber que pra eles só resta a lata de lixo da história. Neste momento é necessário deixar claro: revolução de 64 é denominação da direita. Para nós, o que aconteceu foi um golpe militar-civil, que durante 21 anos pisoteou a Nação.
Que continuem hoje a babar e a estrebuchar, conspirando contra os governos petistas eleitos democraticamente. Enquanto os cães ladram a caravana do avanço social, político e econômico não pára.
Num momento em que a mídia comercial só fala em mensalão e numa crise na qual torcem que o Brasil caia, é interessante relembrar que o golpe de 64 foi o maior mensalão de todos os tempos, bem como abriga similaridades impressionantes entre o ontem e o hoje.
Documentos inéditos e oficiais, amparados em depoimentos de acadêmicos norte-americanos e brasileiros, revelam como, sob o pretexto do avanço comunista em Cuba, no Brasil e na América Latina, os Estados Unidos vieram ao Brasil e compraram, literalmente, deputados, senadores, governos estaduais e, acima de tudo, meios de comunicação, para participar da estratégia americana de derrubar o governo João Goulart e os avanços sociais que ele representava.
Baseado em vasto material a respeito, Camilo Tavares, filho de um exilado político da ditadura, o jornalista Flávio Tavares, dirigiu um dos mais sérios documentários sobre a questão: O Dia que durou 21 anos, de 2011, produção da TV Brasil que tem como ponto de partida a crise provocada pela renúncia do presidente Jânio Quadros, em agosto de 1961, até o ano de 1969, com osequestro do então embaixador dos Estados Unidos no Brasil, Charles Burke Elbrick.
Na década de 60, empresas norte-americanas concessionárias de serviços como energia ou telefonia tinham suas concessões vencendo, em um quadro onde não tinham cumprido as exigências do Brasil para que se instalassem definitivamente aqui. Era direito do governo brasileiro, portanto, renová-las ou não. Mas os norte-americanos, obviamente, não aceitariam um não como decisão.
As televisões norte-americanas, de então, apresentavam longos programas sobre o risco de o Brasil se insurgir contra seus interesses. E alertavam que “para onde o Brasil for a América Latina irá junto”.O próprio presidente Kennedy falava abertamente aos americanos que seu governo “não aceitaria” uma decisão eleitoral do povo brasileiro que contrariasse os interesses dos EUA..
A estratégia norte americana era ampla. Tentaram comprar o povo brasileiro – e os de outros países da América Latina – despejando na região quantidades imensuráveis de dinheiro através de um programa que intitularam “Aliança para o Progresso”.
Sob recomendação do embaixador norte americano no Brasil, Lincoln Gordon, os Estados Unidos decidiram também que era necessário organizar as forças militares e políticas contra o governo e realizar uma campanha de “enfraquecimento” e de “desestabilização” do governo federal. Para esse fim, a arma mais importante foi a imprensa.
Veículos como os jornais O Estado de São Paulo e O Globo, receptáculos de quantidades inconcebíveis de dólares desembolsados pelos Estados Unidos, passaram a fazer campanha anticomunista relatando os “horrores” da União Soviética, de Cuba, etc, e afirmando que o mesmo estava prestes a acontecer no Brasil. Parlamentares beneficiados passaram a votar no Congresso como queria o presidente… dos Estados Unidos.
Os recursos chegavam aos destinatários por meio de uma trama criminosa. O distribuidor ianque, que corrompeu a imprensa, parlamentares e governadores de Estado como Carlos Lacerda, chamava-se Instituto de Pesquisas Econômicas e Sociais (IPES). Escritórios dessa agência do golpe foram abertos em São Paulo, no Rio de Janeiro e em Porto Alegre, onde agiam, ampla e abertamente.
O combate midiático aos governos petistas e ao tamanho do Estado que se vê hoje era a mesma tática utilizada em 1964. Esses veículos passaram a verter, dia após dia, acusações e críticas de “descalabro administrativo” e de “corrupção” contra o governo brasileiro. Não passava um único dia sem que inúmeras matérias nesses veículos, entre outros, fossem despejadas sobre a população.
Informações falsas ou manipuladas eram plantadas na mídia, que, como hoje, pouco admitia opiniões divergentes ou dava destaque a desmentidos. E, quando o fazia era de forma totalmente desproporcional. Sem falar que muitos assuntos eram simplesmente vetados.
A grande mídia de então inundava com propaganda contra o governo, cinemas, jornais, rádios, novelas. Não havia como escapar de coberturas como as que o Jornal Nacional fez diariamente contra o governo Lula e continua fazendo contra o governo Dilma.
Qualquer semelhança com o que se passa hoje não é mera coincidência.No Brasil de hoje, a luta das elites contra a reforma agrária, a campanha para provar que em breve viveremos um apagão energético, que a inflação está fora do controle ou que o crescimento está abaixo do esperado, fazem parte da estratégia da direita para manter seus privilégios, onde quer que seja que eles se fundamentem ou se encontrem.
A defesa feita hoje pelos governos petistas de aproximação com países como Cuba, Venezuela, Equador, Argentina, Uruguai, etc e de integração latino americana como única saída para o desenvolvimento e a eliminação da pobreza no continente é criticada pela imprensa de direita assim como foi à época dos ex-presidentes Janio Quadros e João Goulart.
Dentro de um programa de desenvolvimentismo, a Política Externa Independente (PEI) – nome pelo qual ficou conhecida a política externa dos governos de Jânio Quadros e João Goulart – tinha como princípio básico uma atuação independente frente à bipolaridade EUA-URSS existente na época, visando proporcionar ao Brasil os benefícios de uma ampliação do comércio internacional. Este posicionamento era inaceitável paro o governo americano.
O mesmo ocorre hoje em relação à posição do governo brasileiro de decidir pelo financiamento da construção do Porto de Mariel, em Cuba, onde trabalharão conjuntamente centenas de empresas brasileiras e chinesas, criando empregos para brasileiros, gerando divisas para o país, desenvolvendo a região e aumentando o comercio com a China, o gigante dos Brics.
Segundo San Tiago Dantas, chanceler do período parlamentarista do governo João Goulart, “a instabilidade das instituições democráticas no hemisfério (...) tem origem no subdesenvolvimento econômico (...) Se quisermos acautelar a democracia americana dos riscos políticos que a ameaçam, nossas atenções terão de concentrar-se em medidas de promoção do desenvolvimento e da emancipação econômica e social.
Em artigo para a revista Foreign Affairs expondo a nova política externa do desenvolvimentismo, ou seja, a adoção de uma política exterior que pudesse fomentar o desenvolvimento econômico do país e da América Latina, Quadros afirma que “(...) nossa situação econômica coincide com o dever de formar uma frente unida na batalha contra o subdesenvolvimento e todas as formas de opressão”.
O ex-presidente João Goulart, cujos restos mortais estão sendo analisados por dois laboratórios internacionais para definir sua causa mortis, preferiu partir para o exílio porque não queria derramamento de sangue em seu país. Documentos oficiais americanos indicam que navios da frota americana foram posicionados nas costas brasileiras, próximos ao Espírito Santo, numa operação denominada Brother Sam, para o caso de haver resistência interna por setores do exercito brasileiro ou da sociedade civil.
Cinquenta anos depois, quando Lula, Dilma, Chavez, Mujica dentre outros dizem a mesma coisa, que os países da América Latina só serão grandes nações se se unirem e acabarem com a desigualdade social, são criticados pelos mesmos grupos de comunicação que ajudaram a derrubar Goulart, que chamavam a reforma agrária de coisa de comunistas, que defendiam e continuam defendendo os interesses das oligarquias, do sistema financeiro, das elites nacionais e das multinacionais instaladas no país. Só não vê quem não quer.

Golpe de 64: dois importantes eventos nesta quinta-feira - Confiram a programação abaixo (clique na imagem para ampliar):

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