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Ser de esquerda é não aceitar as injustiças, sejam elas quais forem, como um fato natural. É não calar diante da violação dos Direitos Humanos, em qualquer país e em qualquer momento. É questionar determinadas leis – porque a Justiça, muitas vezes, não anda de mãos dadas com o Direito; e entre um e outro, o homem de esquerda escolhe a justiça.
É ser guiado por uma permanente capacidade de se estarrecer e, com ela e por causa dela, não se acomodar, não se vender, não se deixar manipular ou seduzir pelo poder. É escolher o caminho mais justo, mesmo que seja cansativo demais, arriscado demais, distante demais. O homem de esquerda acredita que a vida pode e deve ser melhor e é isso, no fundo, que o move. Porque o homem de esquerda sabe que não é culpa do destino ou da vontade divina que um bilhão de pessoas, segundo dados da ONU, passe fome no mundo.
É caminhar junto aos marginalizados; é repartir aquilo que se tem e até mesmo aquilo que falta, sem sacrifício e sem estardalhaço. À direita, cabe a tarefa de dar o que sobra, em forma de esmola e de assistencialismo, com barulho e holofotes. Ser de esquerda é reconhecer no outro sua própria humanidade, principalmente quando o outro for completamente diferente. Os homens e mulheres de esquerda sabem que o destino de uma pessoa não deveria ser determinado por causa da raça, do gênero ou da religião.
Ser de esquerda é não se deixar seduzir pelo consumismo; é entender, como ensinou Milton Santos, que a felicidade está ancorada nos bens infinitos. É mergulhar, com alegria e inteireza, na luta por um mundo melhor e neste mergulho não se deixar contaminar pela arrogância, pelo rancor ou pela vaidade. É manter a coerência entre a palavra e a ação. É alimentar as dúvidas, para não cair no poço escuro das respostas fáceis, das certezas cômodas e caducas. Porém, o homem de esquerda não faz da dúvida o álibi para a indiferença. Ele nunca é indiferente. Ser de esquerda é saber que este “mundo melhor e possível” não se fará de punhos cerrados nem com gritos de guerra, mas será construído no dia-a-dia, nas pequenas e grandes obras e que, muitas vezes, é preciso comprar batalhas longas e desgastantes. Ser de esquerda é, na batalha, não usar os métodos do inimigo.
Fernando Evangelista

terça-feira, janeiro 24, 2012

Naji Nahas e o crime no Pinheirinho – Um pouco de Naji Nahas, segundo a Óia

do Miro
Altamiro Borges
A mídia burguesa, que historicamente sempre criminalizou os movimentos sociais, não fugiu à regra na cobertura da desocupação do Pinheirinho, promovida de forma covarde e ilegal neste domingo. A maior parte dela, inclusive numa abjeta reportagem da TV Record, tratou os ocupantes como “invasores” e culpados pelas cenas de violência no carente bairro de São José dos Campos (SP).

É sempre assim! Nos momentos de confrontos mais agudos, os barões da mídia se juntam na defesa da “propriedade” e contra os que lutam por direitos humanos mínimos – como o direito à moradia. Nesta “cruzada sagrada”, eles inclusive protegem notórios bandidos, como é o caso do especulador Naji Nahas. De vilão, ele foi tratado como prejudicado no triste episódio do Pinheirinho.
Bandido é tratado como vítima
A chamada grande imprensa até citou que “o terreno de 1,3 milhão de metros quadrados, que virou alvo de um confronto entre policiais e moradores da comunidade do Pinheirinho, pertence à massa falida da empresa Selecta S/A, do empresário libanês Naji Nahas”, conforme notinha do Estadão. Ela também lembrou que o “banqueiro” já foi acusado por crimes financeiros e foi preso.
Mas nenhum veículo midiático colocou seus holofotes sobre o dono ilegal do Pinheirinho. Ele surge como vítima dos “invasores”, que ocuparam o terreno em 2004 e que resistiram, “violentamente”, à ação de despejo. Alguns “calunistas” mais hidrófobos até elogiaram a postura “firme” do governador tucano Geraldo Alckmin na “defesa da propriedade”... do bandido Nahas!
A biografia do especulador
Um simples levantamento sobre a trajetória deste espertalhão indicaria que o prefeito de São José dos Campos, o governador de São Paulo, os barões do Judiciário e os donos da mídia deveriam ser menos parciais na defesa da “sua” propriedade. A biografia de Naji Nahas ajudaria a evitar o massacre dos moradores do Pinheirinho e a buscar uma solução negociada para o conflito.
Conforme relata o Wikipédia, enciclopédia virtual compartilhada, o empresário nascido no Líbano “chegou ao Brasil no começo da década de 1970 com cinqüenta milhões de dólares para investir e montou um conglomerado de empresas que incluía fábricas, fazendas de produção de coelhos, banco, seguradora e outros”.
Bolsa do Rio e Satiagraha
Naji Nahas tornou-se nacionalmente conhecido depois de ter sido acusado como responsável pela quebra da Bolsa de Valores do Rio de Janeiro em1989. Ele tomava empréstimos de bancos e aplicava na bolsa, fazendo negócios por meio de laranjas e inflando as cotações. A descoberta da maracutaia causou a quebra em cascata na bolsa do Rio, que nunca se recuperou totalmente.
Naji Nahas voltou ao noticiário em julho de 2008, quando foi detido pela Polícia Federal, que acatou a ordem de prisão decretada pelo juiz Fausto de Sanctis, da 6ª Vara Federal Criminal de São Paulo, especializada em crimes financeiros e lavagem de dinheiro. Nesta operação, batizada de Satiagraha, também foi preso o banqueiro Daniel Dantas e o ex-prefeito de São Paulo, Celso Pitta.
A reportagem da Veja
Estas e outras histórias cabeludas revelam quem é Naji Nahas, o bandido que conseguiu a reintegração de posse no Pinheirinho. A mídia venal conhece a sua trajetória, mas agora evita dar destaque. Em outras ocasiões, que não envolviam o “sagrado direito à propriedade privada”, ela até já listou os seus crimes. A revista Veja, de outubro de 1997, fez excelente apanhado sobre Nahas.
A reportagem de Antenor Nascimento, intitulada “Promissória ambulante”, lembra que o agiota quase quebrou a bolsa de valores em junho de 1989, “num dos maiores escândalos financeiros da história do país”, que resultou “na liquidação de seis corretoras e num prejuízo calculado em 400 milhões de dólares”. Reproduzo alguns trechos da matéria agora arquivada pela mídia:
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Passados oito anos [do golpe na bolsa], ele contratou pesquisas para avaliar o grau de rejeição que ainda pesa sobre seu nome e o prestígio que sobrou... Aos poucos foi reaparecendo em festas e restaurantes elegantes de São Paulo. E deu uma festança no ano passado, no casamento de sua filha Nathalie, ao preço de meio milhão de dólares pago por um magnata amigo.

Nessa festa, pareceu mesmo que Nahas havia conseguido enterrar o passado. Nos jardins de seu casarão da Rua Guadalupe, endereço de ricos, beberam champanhe noite adentro personalidades como Alfredo Rizkallah, presidente da Bolsa de Valores de São Paulo, Manoel Cintra, atual presidente da Bolsa Mercantil e de Futuros, o então prefeito de São Paulo, Paulo Maluf, o seu sucessor, Celso Pitta, e uma penca de figuras conhecidas.
Nahas circulou deliciado entre os convidados, como fazia nos tempos em que o mundo financeiro estava a seus pés e a imprensa lhe dava o título pomposo de ‘mega-investidor’. Há uma semana, o passado voltou com a brutalidade de uma divisão Panzer. O juiz Guilherme Calmon Nogueira da Gama, da 25ª Vara da Justiça Federal do Rio de Janeiro, condenou Naji Nahas a 24 anos e oito meses de prisão, além de multa de 730.000 reais, pela quebra das bolsas em 1989.
Na mesma sentença, considerando os ‘péssimos’ antecedentes de Nahas, o juiz ordenou a prisão preventiva do investidor... A Interpol foi convocada para rastrear seus passos no exterior, para onde acabara de viajar, e os aeroportos internacionais do país entraram em alerta. Repetiu-se, portanto, a cena ocorrida em 1989, quando policiais caçaram Nahas durante 100 dias. Naquele ano, Nahas escapou das mãos da polícia e, com uma bolsa de roupas, vagou por apartamentos de amigos. Para disfarçar, deixou a barba crescer... No fim, sem conseguir manter-se escondido por mais tempo, Nahas acabou sob regime de prisão domiciliar até a medida ser revogada na Justiça.
Na semana passada, a história se repetiu com uma diferença. Na data da sentença, Nahas estava longe do juiz e da polícia. Em 3 de outubro, viajou a Paris acompanhando um grupo de investidores estrangeiros. De Paris partiu para o Egito, onde assistiu a uma exibição da ópera Aída, entre ruínas, e tomou um barco para um passeio de três dias pelo Nilo. Na última quinta-feira, voou para o Líbano, terra de sua família, para um período de descanso nas montanhas. Nesse dia, foi brindado com uma liminar assinada pelo desembargador Ney Valadares, do Tribunal Federal de Recursos do Rio de Janeiro, suspendendo temporariamente o mandado de prisão, até que se julgue um pedido de habeas-corpus.
O personagem principal do maior solavanco já sofrido pelas bolsas brasileiras é um homem que mede 1,90 metro, fala sete línguas, veste roupas compradas na Europa, mastiga um enorme charuto e é fanático por gamão, o jogo da elite libanesa. Ele colecionava todos os totens da riqueza, como cavalos, lanchas, pinturas impressionistas, apartamento em Paris e o indefectível helicóptero.
A mais valiosa coleção é a de amigos. Nahas se gaba de seu relacionamento estreito com o sultão de Brunei, os duques de Beaufort e os príncipes de Kent - fora a nobreza árabe dos petrodólares. Nahas, estufado como um pavão, gosta muito de falar das suas proezas. A essas histórias do mundo do dinheiro ainda conseguiu reunir a purpurina de contatos em setor mais glamouroso. Nos anos 80, Nahas aparecia nas colunas sociais brasileiras posando para fotos ao lado de personalidades internacionais do cinema ou da música de passagem por São Paulo. A sua trajetória pela órbita dos negócios é uma história estranha e tão fascinante como o próprio Nahas.
Sua família tinha uma empresa têxtil no Egito, confiscada na década de 50 pelo presidente Gamal Abdel Nasser. Os Nahas fugiram para o Líbano, onde montaram uma marmoraria e uma loja de pedras preciosas. Naji casou-se em 1967 com a brasileira Sula Aun, cuja família era dona da Papéis Simão. Veio para o Brasil em novembro de 1969 trazendo um presente da mãe: 50 milhões de dólares internados no país com autorização do Banco Central.
Acabou constituindo um grupo de 27 empresas, administradas pela holding Selecta. Em 1979, começou seu jogo na Bolsa do Rio de Janeiro, a única a operar os mercados futuros, que é o ambiente preferido do especulador. Ele se tornou um mito muito cedo, com manobras que os investidores brasileiros ainda não conheciam. Numa de suas jogadas, apostou contra todo o mercado num negócio com ações da Petrobrás. Venceu, ganhou uma fortuna e deixou os operadores de queixo caído.
Nahas, hoje, a julgar pelas formalidades cartoriais, é um sujeito quebrado com casaca de rico. A mansão onde mora, com piscina, quadra de tênis e até elevador, está hipotecada. A Selecta e suas empresas se transformaram em massa falida. Seus haras estão abandonados, além de hipotecados. Um grande terreno na Avenida Faria Lima, em São Paulo, no qual pretendia construir um shopping, também está hipotecado. Além de hipotecados, seus bens estão indisponíveis.
Em se tratando de Nahas, tudo isso é relativo. O ex-megainvestidor dá festas alavancadas com o dinheiro de amigos. O Rolls-Royce usado no casamento da filha foi emprestado por um deles, o senador Gilberto Miranda, que comprou o automóvel dos Mayrink Veiga, ex-milionários do Rio de Janeiro. Nahas trabalha em um escritório emprestado por amigos, e – detalhe importante – as hipotecas que têm sido executadas pelos credores são compradas por amigos para evitar que Nahas tenha de espremer o próprio fígado na entrega dos bens que foram seus. Desde o tombo da bolsa, Nahas já fez cerca de cinqüenta viagens para fora do país, quase sempre de primeira classe. Sua renda, segundo ele, vem de negócios que faz atualmente no exterior. "Quando não estou me defendendo dessas acusações que fazem contra mim, trabalho. Administro um fundo de investimento nos Estados Unidos e dou consultoria a investidores", diz ele.
O engraçado é que essa pendura é anterior à crise de 1989. Nahas, na verdade, já havia hipotecado tudo para tomar dinheiro destinado às operações na bolsa. Percebe-se aí um fator comum aos especuladores fanáticos. Eles têm a mesma compulsão dos viciados em pôquer, que apostam até o almoço dos filhos. "Ele sempre foi uma promissória ambulante", declara um banqueiro paulista que lhe emprestou dinheiro e não recebeu de volta. Há, no mercado financeiro, um boato antigo e insistente de que o felino Nahas continua a jogar por meio dos seus laranjas. De vez em quando, ao se detectar alguma manobra menos ortodoxa, os operadores pensam no libanês com seu charutão. "Deve ser o turco", comentam.

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