Escarcéu do IPTU de São Paulo prova que elites não querem ceder nada de seus privilégios
A cidade de São Paulo possui mais de 11 milhões de habitantes, distribuídos em 96 distritos.
Nos últimos dias muito se tem debatido sobre o aumento do IPTU na
cidade de São Paulo. A discussão tem sido feita como se os dados sobre o
aumento por distrito fossem todos iguais.
Segundo uma tabela publicada aqui mesmo no Viomundo, 50% dos 96 distritos do município não foram afetados pelo aumento do IPTU.
Isto é: 25 distritos sofreram redução de IPTU (variando de –0,6% a
–12,1% de desconto); 23 foram reajustados na faixa da inflação anual,
sendo que destes somente 4 foram reajustados na casa dos 5%; 19 tiveram
reajuste abaixo da inflação; 14 tiveram aumento que varia de 6,6% a
9,8%. Apenas 34 distritos sofreram reajuste superior a 10,5%, sendo
19,8% o teto.
Só que os dados assim apresentados não mostram com clareza a justeza da proposta aprovada na Câmara Municipal.
Por isso, resolvi cruzar a faixa de aumento com o número de habitantes
por distrito e Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) de cada
localidade.
Cheguei à conclusão que, muito diferente do que vem sendo veiculado na
imprensa, o aumento do IPTU da forma proposta pelo governo Haddad,
traz elementos importantes para o desenvolvimento de uma política
distributiva.
Peguemos o caso dos 34 distritos que tiveram aumento superior a 10,5%.
Pois em 25 deles, o IDH é muito elevado. Correspondem a 67,65% dos
distritos desta categoria de aumento, sendo que os 9 que não estão
nesta lista possuem IDH elevado conforme a tabela abaixo.
Conforme o quadro abaixo, a população da cidade de São Paulo
beneficiada com a fórmula adotada pela prefeitura Haddad (tiveram
redução do valor ou somente a correção da inflação) é de 64,24%, ou
seja, pouco mais de 7,2 milhões de habitantes da capital. Somados
àqueles que tiveram aumento inferior a 10% chegamos a 77,2% da população
que não tem porque reclamar do aumento do IPTU levado a efeito pela
prefeitura.
Moro, por exemplo, no mesmo bairro que o prefeito Haddad, somos vizinhos e vamos arcar com um aumento de 19,8% no valor do IPTU.
Porém, em nosso distrito o lixo é recolhido todos os dias, o caminhão
que recolhe lixo reciclável passa duas vezes por semana, o policiamento
é ostensivo e nada violento com a população do bairro, as ruas são
recapeadas sistematicamente (e isso desde que moro aqui), a luz falta
muito pouco e quando falta é de forma programada e normalmente volta
dentro do estabelecido no comunicado.
Além disso, a água diminui a pressão à noite, mas é raro faltar, o
bairro é todo iluminado, possuímos parques próximos, várias opções de
supermercados de médio e grande porte, alguns 24 horas, feiras em quase
todos os dias da semana, farmácias 24 horas aos montes, metrô à mão e
toda infraestrutura de lazer, com cinemas, bares, restaurantes e
lanchonetes e etc…
É preciso frisar que mesmo nos distritos de maior IDH, como o que eu
vivo com minha família e vizinhos, as residências de valor inferior a
160 mil reais estarão isentas. De modo que os 19.8% não são aplicados,
por exemplo, às poucas favelas e pequenos comércios que existem por
aqui.
Isto mostra o acerto distributivo da gestão Haddad na formulação da
recomposição do imposto IPTU em nossa cidade. O escarcéu que está sendo
feito por setores privilegiados de nossa cidade só mostra porque
vivemos em um país profundamente violento e desigual. As elites não
querem ceder nem uma fração de seus privilégios.
Imagine se houvesse uma atualização real do valor venal das casas e
apartamentos em nossa cidade para servir de base para este cálculo?
Foi um passo importante para a nossa cidade.
Agora é preciso recompor a tarifa da condução, ampliar a frota dos
ônibus, municipalizar o transporte público, afastar aqueles que se
locupletam do dinheiro público e fazer com que os benefícios a todas as
regiões da cidade atinjam os patamares dos distritos com maior IDH,
cujos moradores chiam hoje com o aumento do IPTU.
Marcelo Zelic
é vice-presidente do Grupo Tortura Nunca Mais-SP e membro da Comissão
Justiça e Paz da Arquidiocese de São Paulo. Coordenador do Projeto
Armazém Memória
* Viomundo
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