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Ser de esquerda é não aceitar as injustiças, sejam elas quais forem, como um fato natural. É não calar diante da violação dos Direitos Humanos, em qualquer país e em qualquer momento. É questionar determinadas leis – porque a Justiça, muitas vezes, não anda de mãos dadas com o Direito; e entre um e outro, o homem de esquerda escolhe a justiça.
É ser guiado por uma permanente capacidade de se estarrecer e, com ela e por causa dela, não se acomodar, não se vender, não se deixar manipular ou seduzir pelo poder. É escolher o caminho mais justo, mesmo que seja cansativo demais, arriscado demais, distante demais. O homem de esquerda acredita que a vida pode e deve ser melhor e é isso, no fundo, que o move. Porque o homem de esquerda sabe que não é culpa do destino ou da vontade divina que um bilhão de pessoas, segundo dados da ONU, passe fome no mundo.
É caminhar junto aos marginalizados; é repartir aquilo que se tem e até mesmo aquilo que falta, sem sacrifício e sem estardalhaço. À direita, cabe a tarefa de dar o que sobra, em forma de esmola e de assistencialismo, com barulho e holofotes. Ser de esquerda é reconhecer no outro sua própria humanidade, principalmente quando o outro for completamente diferente. Os homens e mulheres de esquerda sabem que o destino de uma pessoa não deveria ser determinado por causa da raça, do gênero ou da religião.
Ser de esquerda é não se deixar seduzir pelo consumismo; é entender, como ensinou Milton Santos, que a felicidade está ancorada nos bens infinitos. É mergulhar, com alegria e inteireza, na luta por um mundo melhor e neste mergulho não se deixar contaminar pela arrogância, pelo rancor ou pela vaidade. É manter a coerência entre a palavra e a ação. É alimentar as dúvidas, para não cair no poço escuro das respostas fáceis, das certezas cômodas e caducas. Porém, o homem de esquerda não faz da dúvida o álibi para a indiferença. Ele nunca é indiferente. Ser de esquerda é saber que este “mundo melhor e possível” não se fará de punhos cerrados nem com gritos de guerra, mas será construído no dia-a-dia, nas pequenas e grandes obras e que, muitas vezes, é preciso comprar batalhas longas e desgastantes. Ser de esquerda é, na batalha, não usar os métodos do inimigo.
Fernando Evangelista

sexta-feira, junho 18, 2010

EUA logo de chapéu na mão






A indústria bélica, com toda a cadeia produtiva, constitui outra bolha que, mais cedo ou mais tarde, vai explodir. O governo dos Estados Unidos, seja com o presidente Barack Obama ou seja quem o suceder, não terá recursos para subsidiá-la, eternamente, com a encomenda de armamentos pelo Pentágono, nem manter centenas de bases militares e milhares de tropas, em todas as regiões do mundo. Decerto, cortar esses gastos é muito difícil. Afetaria a economia de vários Estados americanos, localizadas, sobretudo, no sunbelt (Texas, Missouri, Florida, Maryland e Virginia), onde funcionam as indústrias de armamentos que empregam tecnologia intensiva de capital. Em tais circunstâncias, em meio a propinas, suborno, pagamento de comissões aos que propiciam as encomendas, e contribuições para a campanha eleitoral dos partidos políticos, o complexo industrial-militar, com enorme peso econômico e político, exerce forte influência sobre o Congresso americano e sobre toda a mídia, principalmente nas redes de televisão. Porém, o incomparável poderio militar dos Estados Unidos tem limites econômicos. Irresponsabilidade fiscal, descontrole dos gastos públicos, altos déficits orçamentários, contínuo déficit na balança comercial, elevado endividamento externo, corrupção inerente ao conluio entre indústria bélica e o Pentágono, representado pelo complexo industrial-militar, recessão - fatores similares aos que produziram a crise da Grécia – representam a maior ameaça e podem derrotar a superpotência. E essa extrema vulnerabilidade de sua economia, com possibilidade de insolvência, as agências de classificação de risco não apontam.

Em tais circunstâncias, o default da Grécia, se ocorresse, não só abalaria toda a Eurozona. Também afetaria a estrutura econômica e financeira dos Estados Unidos, cuja política fiscal a longo-termo é insustentável. Mas o problema não decorre principalmente dos gastos com os serviços sociais e de saúde, como os conservadores republicanos e mesmo alguns democratas acusam. O câncer que corrói a economia americana é o militarismo, alimentado pelos profundos interesses do complexo industrial-militar, nos grandes negócios em que as grandes corporações e militares se associam, fomentando um clima de supostas ameaças, um ambiente de medo, com o propósito de compelir o Congresso a aprovar vultosos recursos para o Pentágono e outros órgãos vinculados à defesa.



do Carta Capital

“As coisas vão piorar”, alerta o Prêmio Nobel Josefh Stigritz

Entrevista Stigritz publicado na página do Vermelho.


Em entrevista aos jornalistas George Smith Alexandre e Sugata Ghosh, indianos, colabores habituais do The Economic Times, o economista norte-americano Joseph Stiglitz, Prêmio Nobel da Economia em 2001 e crítico do neoliberalismo, revelou que está pessimista quanto ao futuro dos Estados Unidos e outras potências ocidentais, mas é “otimista quanto à Índia e à China. Particularmente com a China, cujo crescimento econômico é agora muito intenso em recursos”.

Ele acredita que o crescimento chinês promoverá “uma grande procura de mercadorias, o que beneficiará outros países em via de desenvolvimento. O seu crescimento ajudará a América Latina e alguns outros mercados emergentes. Mas não basta para salvar a Europa e os EUA. Na realidade, o que fará é criar-lhes um problema, porque os preços das matérias-primas subirão.”

Novas crises virão, na opinião do economista. “Não se assustem, sabemos que vai acontecer. Sabemos que vai haver mais quebras hipotecárias. Esperamos que em 2010 haja mais que em 2009. As coisas vão piorar. Essa é uma das razões para que eu não seja otimista a respeito da pretendida recuperação. A administração não fez praticamente nada na questão das execuções hipotecárias e desocupações. E há dois problemas. Um, é o da atualização revista das taxas de juro e, falando de greves, as coisas piorarão, quando os tipos de juro começarem a voltar ao normal. O outro problema é que mais de um quarto das hipotecas estão em quebra técnica por causa dos preços imobiliários terem baixado mais de 30%.”

George Smith Alexander e Sugata Ghosh: É evidente que a Grécia não tem maneira imediata de endireitar a sua economia e, na próxima década, outras regiões do mundo poderão experimentar problemas semelhantes. Ainda não chegou a hora das nações governantes se reunirem e cancelarem a dívida global? Está claro que a política que se faz agora na Europa é errônea. A política atual pretende impor uma austeridade extrema. Isso irá resultar numa economia mais débil e com menores receitas fiscais, de modo que a redução dos déficits será muito menor que a esperada. É um modelo de austeridade que já fracassou na Argentina. A política atual, que diz que acima de tudo o que devemos fazer agora é livrarmo-nos do déficit, não irá empurrar o mundo para um segundo afogamento ou, pelo menos, para uma diminuição à escala planetária? Assim, a única alternativa é alguma forma de reestruturação da dívida.


Stiglitz: É evidente que se houvesse confiança na Grécia podia-se ir, passo a passo, com os pagamentos da dívida. O que se pareceria mais com situações já vividas no Brasil e na Argentina. O Brasil tinha uma crise de dívida que acabou por se resolver graças à liquidez. Até se chegou a uma depreciação do valor da dívida. Uma vez que as irracionalidades do mercado se foram diluindo o Brasil começou a crescer e agora ninguém pensa no Brasil como um país com um grande problema de dívida. Julgo que a maioria dos países se encontra numa situação igual à do Brasil. Se os tipos dos juros se mantiverem relativamente baixos e os mercados calmos não irão ter maiores dificuldades.

George Smith Alexander e Sugata Ghosh: Mas o senhor não pensa que qualquer dia a China terá que impedir que persista a dívida americana?

Stiglitz: Não. A dívida dos Estados Unidos é diferente da dos outros países, pois os EUA prometem pagar em dólares e controlam a máquina que os imprime. É assim que sempre é capaz de pagar as suas obrigações como devedor. Pode ser que os dólares cheguem a não valer muito. A questão para os EUA é se os dólares com que pagam valem o que valem quando a China emprestou o dinheiro. O impedimento é esse.

George Smith Alexander e Sugata Ghosh: Enquanto os países podem imprimir notas podemos ir de bolha em bolha. Mas também não podemos pensar regressar ao padrão ouro.

Stiglitz: Têm razão. Compreendemos agora que o padrão ouro carece da flexibilidade necessária e não funciona numa economia moderna. E não conseguimos que funcione outro sistema.

Um dos problemas fundamentais é o sistema do dólar como moeda de reserva. Esse sistema faz com que haja uma excessiva dependência por um só país - os EUA - quando a oferta de moeda da dívida desse país é determinada por problemas internos do próprio país e não por problemas e preocupações mundiais. Uma das principais propostas apresentadas pela Comissão das Nações Unidas presidida por mim foi a criação de um novo sistema de reserva global. China, França e muitos outros países apoiaram-na. Isto tinha que ter prioridade máxima a longo prazo.

A crise atual foi realmente causada pelo setor privado. A lição que tirei foi esta: não podemos continuar a permitir que o setor privado se meta neste tipo de riscos excessivos como se fosse uma coisa banal. Procedemos corretamente em resgatá-lo. Mas agora temos que sofrer as consequências de o termos feito.

George Smith Alexander e Sugata Ghosh: Bem, a Lei da Regulação Financeira serve para limitar os riscos. Todavia, umas regras sufocantes não seriam capazes de matar partes do mercado financeiro e terminar deitando fora o menino com a água suja do banho?

Stiglitz: Não. Pelo contrário, as regras propostas não são suficientemente duras. O setor financeiro gastou enormes somas de dinheiro com dissoluções e acabou por ter êxito. Assim como compraram a desregulação, também compraram o resgate, e agora estão a conseguir dissolver as regras de controle, embora não tanto como desejavam. O que se podia dizer é que foi um triunfo parcial da democracia. Todavia, não sabemos se essas regras se manterão. A administração (Obama) está do lado errado.

Por exemplo, uma das cláusulas diz que o governo dos EUA não pode subscrever derivados de alto risco que, no caso da AIG, custaram 170 bilhões de dólares. Os bancos não deveriam participar em atividades de apostas e decorre um debate sobre se a AIG se dedicava a apostas ou a seguros. Está claro que se se tratava de apostas não deveriam estar publicamente garantidas. Uma possibilidade é dizer que se está seguro pela FDIC (Corporação Federal de Seguros de Depósitos, na sua sigla em inglês) não pode subscrever essas políticas de apostas como políticas de seguros. A administração e a FED disseram que isso é uma parte importante da atividade creditícia. Todavia, só um punhado de bancos é que as praticam. Se fosse uma parte importante não se limitaria a um punhado de bancos, praticavam-na a maioria dos bancos.

George Smith Alexander e Sugata Ghosh: Como é que isso afeta o futuro do setor financeiro norte-americano?

Stiglitz: O sistema financeiro norte-americano tinha um volume totalmente desproporcionado em relação ao volume das nossas poupanças. Somos a maior economia, mas a nossa taxa de poupança é muito baixa. Os nossos mercados financeiros eram desproporcionadamente grandes. A razão disso há que ir procurá-la no fato das pessoas acreditarem que os mercados norte-americanos sabiam gerir melhor os riscos e atribuir mais eficazmente o capital. A lição da crise é que isso não é correto. O que fazem é apostar com o dinheiro dos outros. E isso chegou ao fim.

Falando de poupanças, no Japão, o número de pessoas que se aposentam é superior ao número de pessoas que poupam. Em breve terão os japoneses que se endividarem no estrangeiro para acudir a esse déficit, o que poderá elevar os juros.

A razão da dívida japonesa em relação ao seu PIB é de 180%, uns 50% maior que o da Grécia, e a única razão porque o Japão não está em dificuldades é porque não depende do estrangeiro. Para pôr as coisas em perspectiva, a taxa interior de poupança grega é superior à da Alemanha. De modo que essa ideia dos gregos serem esbanjadores não é verdadeira.

Agora, se a taxa de poupança japonesa cair, o Japão irá depender do estrangeiro, e isso poderá levar a taxas de juros mais elevadas. Até que ponto, dependerá da confiança dos mercados. Os mercados já demonstraram um tipo de irracionalidade: exuberância irracional e pessimismo irracional. Se os tipos de juros continuarem baixos, dadas as capacidades japonesas, o Japão poderá rolar a dívida. Quer dizer, se os tipos globais de juro se mantiverem relativamente baixos e as pessoas conservem a confiança, não creio que o Japão se encaminhe necessariamente para uma crise. Todavia, não é impossível.

George Smith Alexander e Sugata Ghosh: O euro e a União Europeia sobreviverão?

Siglitz: O que se passou nestes meses passados foi decepcionante. A Alemanha estava renitente a prestar assistência e quando resolveu fazê-lo o único marco fiscal que lhe ocorreu foi… não foi o de um fundo de solidariedade, mas de austeridade. Os problemas da Grécia ultrapassam em muito as suas fronteiras, porque as suas exportações mais importantes - como o turismo, diminuíram por culpa da crise global. Tinha um problema estrutural, mas o grosso do déficit não causou os seus problemas estruturais, mas sim a crise global.

Procura-se corrigir os problemas estruturais sem fazer nada sobre a sua situação.

O positivo é que, por fim, a Alemanha e os outros países acabaram por prestar assistência à Grécia. Os benefícios que a Alemanha e os outros países retiram do euro são suficientemente elevados, o compromisso político é suficientemente grande e eu creio que o euro irá sobreviver. Contudo será através dum processo confuso e enredado, o que significa muita volatilidade financeira global. Não necessita da união fiscal para sobreviver, mas precisa de algum tipo de assistência e de programas mais institucionalizados que os atuais. Há risco de que não sobreviva e esse é o preço que se exige dos países. A Espanha é um bom exemplo, porque antes da crise tinha superávit. Assim ninguém pode acusá-la de libertinagem fiscal.

George Smith Alexander e Sugata Ghosh: O senhor disse que há o risco de outras crises financeiras dentro de cinco ou dez anos. De onde e porquê?

Siglitz: O problema é, evidentemente, muito sério nos países desenvolvidos. Nos EUA poderá haver uma crise de confiança no dólar: já a tivemos antes, nos anos 70.

Mas também poderá vir dos mercados emergentes, porque o que está ocorrendo é que, para reanimar a economia americana, inundamos o mundo com liquidez, mas isso não se traduziu em crédito nos EUA. Uma vez mais, isso é determinado por uma ideologia de livre mercado que pouco mais ou menos reza assim: dá o teu dinheiro aos bancos e não te preocupes com o que eles fazem com ele.

Contudo, no mundo da globalização o que os bancos perguntam é qual é o melhor lugar para investir. E chegaram à conclusão que o melhor lugar não é nos EUA. A Reserva Federal está a criar liquidez que vai irrigar outros mercados e a FED (banco central dos EUA) diz que isso é o seu problema, não o nosso.

Leia a íntegra aqui.

Esta entrevista com o Prêmio Nobel da Economia Joseph Stiglitz, concedida a George Smith Alexandre e Sugata Ghosh, foi publicada em http://economictimes.com/. Reproduzida do Diario.info. Tradução de João Manuel Pinheiro


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