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Ser de esquerda é não aceitar as injustiças, sejam elas quais forem, como um fato natural. É não calar diante da violação dos Direitos Humanos, em qualquer país e em qualquer momento. É questionar determinadas leis – porque a Justiça, muitas vezes, não anda de mãos dadas com o Direito; e entre um e outro, o homem de esquerda escolhe a justiça.
É ser guiado por uma permanente capacidade de se estarrecer e, com ela e por causa dela, não se acomodar, não se vender, não se deixar manipular ou seduzir pelo poder. É escolher o caminho mais justo, mesmo que seja cansativo demais, arriscado demais, distante demais. O homem de esquerda acredita que a vida pode e deve ser melhor e é isso, no fundo, que o move. Porque o homem de esquerda sabe que não é culpa do destino ou da vontade divina que um bilhão de pessoas, segundo dados da ONU, passe fome no mundo.
É caminhar junto aos marginalizados; é repartir aquilo que se tem e até mesmo aquilo que falta, sem sacrifício e sem estardalhaço. À direita, cabe a tarefa de dar o que sobra, em forma de esmola e de assistencialismo, com barulho e holofotes. Ser de esquerda é reconhecer no outro sua própria humanidade, principalmente quando o outro for completamente diferente. Os homens e mulheres de esquerda sabem que o destino de uma pessoa não deveria ser determinado por causa da raça, do gênero ou da religião.
Ser de esquerda é não se deixar seduzir pelo consumismo; é entender, como ensinou Milton Santos, que a felicidade está ancorada nos bens infinitos. É mergulhar, com alegria e inteireza, na luta por um mundo melhor e neste mergulho não se deixar contaminar pela arrogância, pelo rancor ou pela vaidade. É manter a coerência entre a palavra e a ação. É alimentar as dúvidas, para não cair no poço escuro das respostas fáceis, das certezas cômodas e caducas. Porém, o homem de esquerda não faz da dúvida o álibi para a indiferença. Ele nunca é indiferente. Ser de esquerda é saber que este “mundo melhor e possível” não se fará de punhos cerrados nem com gritos de guerra, mas será construído no dia-a-dia, nas pequenas e grandes obras e que, muitas vezes, é preciso comprar batalhas longas e desgastantes. Ser de esquerda é, na batalha, não usar os métodos do inimigo.
Fernando Evangelista

domingo, junho 20, 2010

Sebastião Salgado com Chico Buarque e José Saramago no SBT o super ego do entrevistador continua o mesmo mas a pobreza principalmente de espírito.+











do História Vermelha

do ano de 1997

Jornal do Vaticano atira pedras no escritor José Saramago

Saramago não tinha o direito de incriminar a um Deus ao qual jamais acreditou, diz a Santa Sé

O diário do Vaticano, L'Osservatore Romano, atacou o recém falecido escritor português José Saramago, dedicando-lhe um artigo no qual o define como "um populista extremista de ideologia antirreligiosa ancorado no marxismo".

Um dia depois da morte do escritor, o vespertino da Santa Sé publica um duro obituário sob o título A onipotência (presumida) do narrador assinado por Claudio Toscani, no qual repassa a vida do Prêmio Nobel de Literatura de 1998, que foi muito crítico com o catolicismo.

"Foi um homem e um intelectual de nenhuma transigência metafísica, até o final ancorado numa confiança no materialismo histórico, aliás o marxismo", dispara o artigo.

O texto repassa a produção literária do português, analisando também sua novela O Evangelho Segundo Jesus Cristo (1991), uma obra "irreverente" que supõe um "desafio à memória do Cristianismo, do qual não sabe o que salvar".

"Com respeito à religião, sua mente fixada como sempre por uma desestabilizadora intenção de banalizar o sagrado e por um materialismo libertário que quanto mais avançava nos anos mais se radicalizava, Saramago nunca se abandonou à simplicidade teológica", afirma o artigo.

"Um populista extremista como ele, que se havia encarregado de examinar os males do mundo, deveria ter abordado em primeiro lugar o problema das falhas estruturais humanas, desde as histórico-políticas até as sócio-econômicas, em vez de atacar logo o plano metafísico", prossegue.

O artigo do L'Osservatore Romano assegura que Saramago não deveria "incriminar, inclusive demasiado comodamente e longe de qualquer consideração, a um Deus no qual jamais acreditou, pela via de sua onipotência, de sua onisciência, e de sua onividência".
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Só vou lembrar uma das tantas frases geniais de Saramago, a propósito desse blablablá reativo e de argumentos indigentes da Santa Sé, escrito pelo sub do sub do sub Claudio Toscani:

"Eu não escrevo para agradar ou para desagradar, escrevo para perturbar".

Saramago, depois de morto, ganha outro Nobel

Fecho de ouro numa vida dedicada a denunciar o delírio na realidade

Quem não gostaria de ser objeto do tribunal eclesiástico da Santa Sé? Ainda bem que agora vibra apenas o seu martelo moral, porque uma vez o sujeito ia direto para a fogueira, sem apelação.

Tomás de Torquemada morreu no ano de 1498. Pois, mesmo passados cinco séculos suas práticas continuam vivas e aplicáveis, agora apenas com fogueira moral do PC (partido católico) do Vaticano.

Mesmo assim, com a fogueira simbólica e tudo, o Vaticano carbonizou sábado passado o recém falecido José Saramago. Antes de queimá-lo apedrejou-o mil vezes com as pedras do ramerrão dogmático católico.

Saramago, morto, não pode se defender. Bela lição de cristandade deixa a Igreja romana! Dos quase noventa anos de vida, Saramago criticou duramente as religiões em mais de três longas décadas. Silêncio. Morto, o vil tribunal resolve levantar suas objeções morais esfarrapadas contra o grande pensador.

De qualquer forma, a vileza presente tem o sabor simbólico do seu contrário. Sinto que estão premiando Saramago. E a energia cósmica do grande escritor diverte-se, dá cambalhotas em alguma estrela brilhante do páramo infinito.

Quem não gostaria de morrer e ser credenciado como o que sempre denunciou a farsa da ilusão religiosa?

Já se vê que Saramago acaba de merecer mais um Prêmio Nobel, o de ter ajudado a desconstituir o delírio na realidade que é a paranóia religiosa. Convenhamos, que com as armas da literatura, tecendo textos ditados pela imaginação, este escritor corajoso ajudou a minar a institucionalidade material das religiões, com seus podres poderes terrenos, suas trágicas opções políticas, seus bancos endinheirados e suas práticas de corrupção, violência física e simbólica contra crianças e jovens, alienação generalizada e sobretudo por espalhar dogmas que dividem os humanos ao invés de congraçá-los em boa vontade e tolerância mútua.

Saramago agora - de fato - deve estar perfeitamente feliz.

Coisas da vida.

Foto: Viúva de Saramago, Pilar del Rio, olha para o corpo no funeral em Lisboa ao lado da filha dele, Violante. Fotografia de Rui Gaudêncio/Publico.pt

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