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Ser de esquerda é não aceitar as injustiças, sejam elas quais forem, como um fato natural. É não calar diante da violação dos Direitos Humanos, em qualquer país e em qualquer momento. É questionar determinadas leis – porque a Justiça, muitas vezes, não anda de mãos dadas com o Direito; e entre um e outro, o homem de esquerda escolhe a justiça.
É ser guiado por uma permanente capacidade de se estarrecer e, com ela e por causa dela, não se acomodar, não se vender, não se deixar manipular ou seduzir pelo poder. É escolher o caminho mais justo, mesmo que seja cansativo demais, arriscado demais, distante demais. O homem de esquerda acredita que a vida pode e deve ser melhor e é isso, no fundo, que o move. Porque o homem de esquerda sabe que não é culpa do destino ou da vontade divina que um bilhão de pessoas, segundo dados da ONU, passe fome no mundo.
É caminhar junto aos marginalizados; é repartir aquilo que se tem e até mesmo aquilo que falta, sem sacrifício e sem estardalhaço. À direita, cabe a tarefa de dar o que sobra, em forma de esmola e de assistencialismo, com barulho e holofotes. Ser de esquerda é reconhecer no outro sua própria humanidade, principalmente quando o outro for completamente diferente. Os homens e mulheres de esquerda sabem que o destino de uma pessoa não deveria ser determinado por causa da raça, do gênero ou da religião.
Ser de esquerda é não se deixar seduzir pelo consumismo; é entender, como ensinou Milton Santos, que a felicidade está ancorada nos bens infinitos. É mergulhar, com alegria e inteireza, na luta por um mundo melhor e neste mergulho não se deixar contaminar pela arrogância, pelo rancor ou pela vaidade. É manter a coerência entre a palavra e a ação. É alimentar as dúvidas, para não cair no poço escuro das respostas fáceis, das certezas cômodas e caducas. Porém, o homem de esquerda não faz da dúvida o álibi para a indiferença. Ele nunca é indiferente. Ser de esquerda é saber que este “mundo melhor e possível” não se fará de punhos cerrados nem com gritos de guerra, mas será construído no dia-a-dia, nas pequenas e grandes obras e que, muitas vezes, é preciso comprar batalhas longas e desgastantes. Ser de esquerda é, na batalha, não usar os métodos do inimigo.
Fernando Evangelista

sábado, maio 30, 2015

São Paulo não somente deixou de ser o motor da economia brasileira como vem sendo a nossa maior âncora. O país só não cai mais porque outros centros dinâmicos foram criados nos últimos anos.

Paulo Copacabana: PIB do Estado de São Paulo puxa o Brasil para baixo; a “locomotiva” já era


Governo do Estado de SP
por Paulo Copacabana, especial para o Viomundo
Gosto de provocar meus amigos paulistas — e tenho muitos! — do período em que morei alguns anos por essas bandas.
O paulista típico tem certeza de que o Brasil representa um fardo para a sua pujança. Apenas a locomotiva São Paulo “puxa” este enorme trem pesado e vagaroso, cheio de corrupção, vagabundagem e leniência por todos os lados.
Para o paulista típico, a herança de Getúlio Vargas deveria ser destruída para sempre. Não tem a consciência de que foi no período varguista que o Estado brasileiro foi montado de fato, alçando as relações público-privadas a um outro patamar, principalmente com as empresas paulistas. Também não entende que Vargas salvou a economia cafeeira paulista nos anos 30, e com ela a sua indústria emergente e seu pujante mercado interno de consumo e de trabalho. Nada disso comove os paulistas e seu espírito cosmopolita “descolado do país”.
A verdade é que a política desenvolvimentista do país desenvolveu, sobretudo, a economia paulista, com generosos subsídios e incentivos. As políticas cambiais e industriais dos anos 50, 60 e 70 tornaram o Estado de São Paulo esta gigantesca “potência econômica”.
Após a crise da dívida brasileira nos anos 80 (reduzindo sua capacidade de intervenção) e a hegemonia do pensamento neoliberal dos anos 90 (abrindo espaço para o “deus mercado”), o projeto desenvolvimentista nacional se encerra, perdendo com ele a indústria e a economia paulista.
Não por outro motivo o Estado de São Paulo começa a perder fôlego. Na briga do salve-se quem puder, outros Estados lançam mão da “guerra fiscal” para atrair indústrias e empregos, guerra esta de soma zero para o país, mas que aprofundam os problemas da economia paulista. Posando ainda como “locomotiva”, os governos paulistas seguem esperando que o governo federal impeça a guerra fiscal, mas não compreendem que este não é o único problema.
Falta aos governos do Estado de São Paulo, sobretudo nas últimas duas décadas, visão de desenvolvimento econômico e social.
A indústria paulista perde importância e peso econômico, e o Estado torna-se cada vez mais dependente da economia dos serviços.
Todos sabem que o “motor da economia” está localizado no setor industrial, onde repousa o verdadeiro progresso tecnológico, os melhores empregos, a maior produção de valor adicionado.
A perda de importância do Estado de São Paulo tem a ver com esta questão, ironicamente agravada pela política dos anos FHC na década de 90, que aprofundou a desindustrialização paulista e brasileira, com forte valorização cambial e a perda de importantes “elos da cadeia produtiva” no país. Já naquele período fomos invadidos por produtos estrangeiros, e setores inteiros da economia paulista foram sendo desmontados (têxtil, calçadista, autopeças, etc.).
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Engraçado, muitos paulistas que conheço adoram FHC, um dos maiores responsáveis pela perda de importância do Estado no cenário nacional.
Por outro lado, detestam o governo Lula, que, ao ampliar o mercado de consumo interno, permitiu que milhares de empregos fossem criados no Estado, reativando fortemente as empresas paulistas.
Este fôlego, contudo, não poderia se sustentar, uma vez que a “armadilha” da valorização cambial não foi desmontada pelo governo federal e os governos paulistas não quiseram “montar” políticas desenvolvimentistas regionais.
No Estado de SP, manteve-se a política do “ajuste fiscal permanente”, prevalecendo os megassuperávits fiscais em detrimento do desenvolvimento.
Tudo isso, aliado à política de fortes investimentos sociais e de infraestrutura do governo federal na região Nordeste, o “boom” do agronegócio no Centro-Oeste e a economia do petróleo no Rio de Janeiro, está fazendo com que o Estado se torne não mais a locomotiva do país, mas um enorme e pesado vagão deste trem.
Talvez esta questão explique a beligerância atual da elite paulista em relação aos governos Lula e Dilma. Como diria aquele marqueteiro americano, “É a economia, estúpido”.
O ódio ao governo federal e suas políticas sociais e desenvolvimentistas tornam-se a explicação para todos os problemas do Estado bandeirante. Em parte estão certos, na medida em que nestes últimos anos o governo federal passou a investir forte nas regiões mais pobres do país.
Em grande parte, estão errados, na medida em que o Estado de SP não fez sua lição de casa: vendeu todas as suas instituições de fomento (Banespa, Nossa Caixa); deixou de implantar um verdadeiro sistema de inovação, aproveitando o potencial das suas universidades, institutos e fundações de pesquisa; permitiu o avanço da monocultura da cana-de-açúcar em todo o interior; deixou de implantar políticas de desenvolvimento nas regiões mais pobres do Estado, que continuam como sempre estiveram; assistiu ao desmonte de grande parte do seu parque industrial.
Toda esta narrativa pode ser comprovada por alguns dados que obtive nos sites do IBGE e da Fundação SEADE, esta última do próprio governo paulista.
A indústria, que representava 33,5% da economia paulista em 1995, passou para apenas 25% em 2012. Já o setor de serviços, saltou de 64,9% em 1995 para 73,1% em 2012. A perda do “motor” da economia paulista está clara.
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Outros números revelam que a economia do Estado de São Paulo perde importância em relação a outras regiões de forma acelerada.
Em 1995, a economia paulista representava 37,3% da economia brasileira. Em 2014, segundo projeções da própria Fundação SEADE, deve ficar com apenas 28,7%.
A perda, em valores absolutos, significa menos R$ 450 bilhões na economia paulista.
Estes valores, diga-se de passagem, foram adicionados às economias do Nordeste, Norte e Centro-Oeste, além de Rio de Janeiro e Minas Gerais. Estas regiões passaram a “puxar” a economia brasileira. O Sul permaneceu estagnado.
Interessante notar que esta radiografia econômica segue em sintonia com a radiografia do voto nas últimas eleições nacionais. Outra vez, “É a economia, estúpido”.
Os últimos números que estão saindo são ainda mais desalentadores para São Paulo.
Além de não ser mais a locomotiva do país, o Estado torna-se um vagão muito pesado, segurando a economia brasileira e “puxando-a” para baixo.
Em 2014, enquanto a economia brasileira cresceu 0,10%, a economia paulista recuou 1,90%.
Em 2015, nos primeiros três meses, enquanto o PIB brasileiro recuou 1,6%, o PIB paulista segue ladeira abaixo, caindo 3,3%.
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São Paulo não somente deixou de ser o motor da economia brasileira como vem sendo a nossa maior âncora. O país só não cai mais porque outros centros dinâmicos foram criados nos últimos anos.
A elite paulista deveria, na verdade, clamar por mais políticas desenvolvimentistas do Estado brasileiro. Ela depende cada vez mais do Brasil.
Não adianta, pelo visto, as panelas continuarão batendo nas “varandas gourmet” de uma elite que perde importância para o país.
Qualquer dia as outras regiões é que vão querer se separar de São Paulo.
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*Viomundo

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