Páginas

Ser de esquerda é não aceitar as injustiças, sejam elas quais forem, como um fato natural. É não calar diante da violação dos Direitos Humanos, em qualquer país e em qualquer momento. É questionar determinadas leis – porque a Justiça, muitas vezes, não anda de mãos dadas com o Direito; e entre um e outro, o homem de esquerda escolhe a justiça.
É ser guiado por uma permanente capacidade de se estarrecer e, com ela e por causa dela, não se acomodar, não se vender, não se deixar manipular ou seduzir pelo poder. É escolher o caminho mais justo, mesmo que seja cansativo demais, arriscado demais, distante demais. O homem de esquerda acredita que a vida pode e deve ser melhor e é isso, no fundo, que o move. Porque o homem de esquerda sabe que não é culpa do destino ou da vontade divina que um bilhão de pessoas, segundo dados da ONU, passe fome no mundo.
É caminhar junto aos marginalizados; é repartir aquilo que se tem e até mesmo aquilo que falta, sem sacrifício e sem estardalhaço. À direita, cabe a tarefa de dar o que sobra, em forma de esmola e de assistencialismo, com barulho e holofotes. Ser de esquerda é reconhecer no outro sua própria humanidade, principalmente quando o outro for completamente diferente. Os homens e mulheres de esquerda sabem que o destino de uma pessoa não deveria ser determinado por causa da raça, do gênero ou da religião.
Ser de esquerda é não se deixar seduzir pelo consumismo; é entender, como ensinou Milton Santos, que a felicidade está ancorada nos bens infinitos. É mergulhar, com alegria e inteireza, na luta por um mundo melhor e neste mergulho não se deixar contaminar pela arrogância, pelo rancor ou pela vaidade. É manter a coerência entre a palavra e a ação. É alimentar as dúvidas, para não cair no poço escuro das respostas fáceis, das certezas cômodas e caducas. Porém, o homem de esquerda não faz da dúvida o álibi para a indiferença. Ele nunca é indiferente. Ser de esquerda é saber que este “mundo melhor e possível” não se fará de punhos cerrados nem com gritos de guerra, mas será construído no dia-a-dia, nas pequenas e grandes obras e que, muitas vezes, é preciso comprar batalhas longas e desgastantes. Ser de esquerda é, na batalha, não usar os métodos do inimigo.
Fernando Evangelista

terça-feira, outubro 07, 2014

O ataque aos nordestinos nas redes sociais e os limites à liberdade de expressão


149
Uma série de ataques aos nordestinos veio à tona nas redes sociais quando da divulgação do resultado do primeiro turno das eleições presidenciais, no último domingo, o qual confirmou o primeiro lugar de Dilma Rousseff, e a preferência do eleitorado da região Norte e Nordeste.
Dentre as manifestações discriminatórias postadas no Twitter, trazemos duas, em sua original forma: “só aqueles nordestinos malditos que votam na Dilma nossa espero que nunca mais chova la seca pra sempre”; “esses nordestinos fazem 300 filhos e depois ficam dependendo de ‘ bolsa-família’, por isso que a Dilma recebe tudo isso de votos”.
Uma situação muito similar ocorreu em 2010, quando Dilma foi eleita presidente. Há época, Mayara Petruso, estudante de direito, postou o seguinte tuite: “Nordestino não é gente, faça um favor a Sp, mate um nordestino afogado”, pelo qual foi denunciada e condenada a 1 ano, 5 meses e 15 dias de prisão pelo crime de racismo, sendo a pena convertida em serviços comunitários.
Nota-se que uma vez nos deparamos com um discurso de incitação ao ódio, totalmente avesso aos valores cristalizados em um ordenamento jurídico construído sob a égide do princípio vetor da dignidade da pessoa humana (art. , inciso III, daConstituição da República do Brasil), como já assinalamos alhures.
Igualmente já afirmamos que, em hipótese alguma, manifestações de intolerância, seja qual for a sua forma, podem restar protegidas sob o manto da garantia constitucional da liberdade de expressão, haja vista que esse direito, apesar de ser um direito fundamental assegurado em inúmeros tratados internacionais e naConstituição da República do Brasil, não pode ser exercido sem limitações.
Neste diapasão, invocamos novamente a teoria da ponderação de direitos fundamentais, para contrapormos o direito à liberdade de expressão ao princípio da dignidade humana, ao direito à igualdade, à honra, e outros direitos da personalidade violados de forma difusa, devendo, nessas situações, a liberdade de expressão do pensamento ocupar a menor hierarquia nessa ponderação de direitos, dada a ilegitimidade de seu conteúdo discriminatório.
Destarte, em tempos em que a internet é a maior, e talvez a mais acessível plataforma de comunicação humana da atualidade, a liberdade de expressão deve ser exercida com responsabilidade e limitações, pois, como qualquer direito fundamental, não pode e nem deve ser considerado como um direito absoluto.
Marcio Morena
Advogado e Professor
Advogado. Doutorando em Direito e Ciência Política pela Universidade de Barcelona com Master em Estudos Internacionais pela mesma universidade. Mestre em Filosofia Política pela Universidade de São Paulo. Especialista em Direito Empresarial pela Universidade Mackenzie. Bacharel em Filosofia pela Uni...

Nenhum comentário:

Postar um comentário