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Ser de esquerda é não aceitar as injustiças, sejam elas quais forem, como um fato natural. É não calar diante da violação dos Direitos Humanos, em qualquer país e em qualquer momento. É questionar determinadas leis – porque a Justiça, muitas vezes, não anda de mãos dadas com o Direito; e entre um e outro, o homem de esquerda escolhe a justiça.
É ser guiado por uma permanente capacidade de se estarrecer e, com ela e por causa dela, não se acomodar, não se vender, não se deixar manipular ou seduzir pelo poder. É escolher o caminho mais justo, mesmo que seja cansativo demais, arriscado demais, distante demais. O homem de esquerda acredita que a vida pode e deve ser melhor e é isso, no fundo, que o move. Porque o homem de esquerda sabe que não é culpa do destino ou da vontade divina que um bilhão de pessoas, segundo dados da ONU, passe fome no mundo.
É caminhar junto aos marginalizados; é repartir aquilo que se tem e até mesmo aquilo que falta, sem sacrifício e sem estardalhaço. À direita, cabe a tarefa de dar o que sobra, em forma de esmola e de assistencialismo, com barulho e holofotes. Ser de esquerda é reconhecer no outro sua própria humanidade, principalmente quando o outro for completamente diferente. Os homens e mulheres de esquerda sabem que o destino de uma pessoa não deveria ser determinado por causa da raça, do gênero ou da religião.
Ser de esquerda é não se deixar seduzir pelo consumismo; é entender, como ensinou Milton Santos, que a felicidade está ancorada nos bens infinitos. É mergulhar, com alegria e inteireza, na luta por um mundo melhor e neste mergulho não se deixar contaminar pela arrogância, pelo rancor ou pela vaidade. É manter a coerência entre a palavra e a ação. É alimentar as dúvidas, para não cair no poço escuro das respostas fáceis, das certezas cômodas e caducas. Porém, o homem de esquerda não faz da dúvida o álibi para a indiferença. Ele nunca é indiferente. Ser de esquerda é saber que este “mundo melhor e possível” não se fará de punhos cerrados nem com gritos de guerra, mas será construído no dia-a-dia, nas pequenas e grandes obras e que, muitas vezes, é preciso comprar batalhas longas e desgastantes. Ser de esquerda é, na batalha, não usar os métodos do inimigo.
Fernando Evangelista

terça-feira, abril 14, 2015

Um analfabeto político mirim chamado Kim Kataguiri


Paulo Nogueira
É simplesmente inacreditável a quantidade de pseudoluminares de direita que o Brasil vem produzindo nos últimos anos.
A qualidade é desprezível. Onde alguém como Nelson Rodrigues, ou Roberto Campos, ou Mario Henrique Simonsen?
Em nenhum lugar, lamentavelmente.
Em compensação, a tropa não para de ganhar novos soldados rasos. Rasos nos debates, rasos nas formulações, rasos nos textos. Rasos em tudo, em suma, verdadeiros recrutas zeros do reacionarismo.
O mais novo deles é Kim Kataguiri, de 19 anos, líder de um certo Brasil Livre. Em sua louca cavalgada para encontrar um herói do 1%, a imprensa tenta transformá-lo em algo além da definição precisa de Jean Wyllys, um analfabeto político. Eu acrescentaria apenas: mirim.
No final de semana, do alto do fracasso do protesto que ele supostamente organizou em São Paulo, KK pronunciou uma frase que simboliza a obtusidade agressiva da endoidecida direita brasileira. Para ele, o PT tem que levar um tiro na cabeça.
Num mundo menos imperfeito e menos selvagem, alguém como ele diria que o PT tem que ser batido nas urnas, democraticamente.
Mas não: KK carrega uma arma na mente tumultuada, e quer usá-la a todo custo.
A tragédia de KK começa na escolha errada do mentor. Oriental, ele tinha mestres formidáveis à mão.
Confúcio, por exemplo. Os Analetos de Confúcio são um livro curto e simples de ler, e dão a você elementos para tocar com sabedoria sua vida.
Mas a Confúcio KK preferiu a ignorância enciclopédica de Olavo de Carvalho. Se você examinar os pupilos de OC terá uma ideia do que acontece com quem leva a sério suas palavras.
Cito alguns ao acaso: Danilo Gentili, Lobão, Pastor Everaldo, Roger do Ultraje, Rodrigo Constantino e Rachel Sheherazade.
Todos eles somados, você chega a zero. Ou, se for menos condescendente, a menos um. Você espreme um por um, como laranjas, e tudo que obterá se resumirá em duas palavras: estado mínimo.
Não é à toa que a direita não ganha eleições no Brasil: seus propagandistas são terrivelmente ruins.
KK não leu nada, mas pontifica sobre tudo. Numa entrevista para a IstoÉ, admitiu jamais ter lido sequer Friedman, um dos maiores nomes do conservadorismo econômico.
Se não leu Friedman, sendo um “liberal”, é porque não leu coisa nenhuma.
Mesmo assim, carrega uma placa em que revoga Marx. Na mesma entrevista, ele disse ter lido de Marx O Capital.
Chamo meu querido Wellington mais uma vez: quem acredita naquilo acredita em tudo.
Marx não é para principiantes. Estudiosos do Capital sugerem até uma ordem de leitura de capítulos que não foi a adotada pelo próprio Marx.
Por ler Marx, e interpretá-lo à luz destes tempos, Piketty virou Piketty, com seu livro que explica a brutal desigualdade do mundo moderno e sugere maneiras de combatê-la.
Por ter lido as apostilas mastigadas de Olavo de Carvalho, KK virou KK – um garoto de maus instintos e má índole que sonha dar tiros nos outros como se estivesse jogando videogame.
Só no Brasil ele viraria uma estrela da imprensa.
Mas todos os confetes que a mídia está lhe jogando não equivalem, juntos, ao curto diagnóstico de Jean Wyllys.
Eis um analfabeto político.
Mirim.
*DiarioNacional

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