Mídia entra em campanha contra revogação ou revisão da Lei de Anistia
A maior parte da população brasileira quer a revogação ou a revisão da
Lei da Anistia recíproca — 46%, segundo o Datafolha, contra 37% que se
opõem — o ex-ministro José Dirceu defende há tempos um plebiscito para
deliberação a respeito, proposta que nós de sua equipe publicamos aqui
no blog, e a mídia vai na contramão mais uma vez.
Aproveita a passagem dos 50 anos do golpe cívico-militar de 1964 e da
implantação da ditadura para, na esteira do material de análise e
memória que publica a respeito, entrar em aberta campanha contra
qualquer revisão da Lei — revogação, então, não quer nem ouvir falar. Os
jornalões vêm com tudo nessa linha editorial contra. O Globo até já
publicou um editorial combatendo qualquer alteração.
E vocês estão vendo o argumento a que se apegam, em que se fundamentam?
Dizem que a Lei de Anistia foi negociada e pactuada pela nação para
abrir caminho à redemocratização. Dizer isso é faltar com a verdade, é
manipular, a lei não resulta de pacto nenhum. Foi imposta pela ditadura
sob pressão, mas isso não elimina o fato de que foi promulgada por
representantes de um regime que não permitia alternância no Poder,
controle civil sobre os militares e as decisões governamentais, direito
amplo do brasileiro votar e ser eleito e de se associar livremente.
Anistia foi baixada com o Brasil ainda amordaçado
Veio no bojo de uma situação política em que manifestações e passeatas
pró-anistia eram violentamente reprimidas, e as entidades da sociedade
civil e a própria sociedade, como um todo, eram ameaçadas. Tanto que
depois do advento da Lei, continuaram os atentados à bomba — e
incêndios — contra bancas de jornais, a entidades que batalhavam pela
redemocratização como à OAB nacional, e o atentado do Riocentro.
O Congresso que aprovou a Anistia ainda vivia sob o bipartidarismo
artificial imposto pela ditadura e um 1/3 do Senado era biônico,
senadores nomeados pelo presidente Geisel, figura criada pelo-general
presidente quando fechou Câmara e o Senado em 1977 e decretou o Pacote
de Abril. Era, ainda, um Congresso mutilado em seu poderes pelas
cassações e pressões que haviam se iniciado no começo da ditadura, a
partir de 9 de abril de 1964, quando foi baixado o primeiro dos 17 atos
institucionais e 104 atos complementares assinados pelos
generais-ditadores.
Como é que essa lei foi pactuada, e com quem, se um lado detinha a
força, o poder e o porrete, e o outro era obrigado a dizer amém?
Negociada com quem, se contingente numeroso da oposição estava cassado,
banido, exilado, nas prisões ou silenciado pelo medo, por pressões,
pela tortura, por assassinatos e desaparecimentos políticos?
Argumento de que a Lei foi pactuada é furado
A Lei de Anistia em vigor no país há 35 anos pode ser chamada de tudo,
menos de democrática porque não foi negociada coisa nenhuma, não teve o
apoio da totalidade da sociedade civil — esta nem pôde opinar. Foi
imposta por um ditador e teve, mais que tudo, com essa história do
caráter recíproco, propósito primeiro de anistiar criminosos e
torturadores agentes da repressão que em nome do Estado agiram como
foras da lei, e ainda que a política de repressão tenha sido guindada a
uma política de Estado.
É furado, portanto, o principal argumento invocado pelos jornalões, de
que não se deve nem se pode mexer na Lei da Anistia e retirar esse seu
caráter de benefício recíproco porque ela resulta de um pacto da
sociedade para redemocratizar o país. Arrumem outro.
E as Forças Armadas?
Agora, já que estamos falando em anistia, golpe e ditadura, não faz
nenhum mal a equipe deste blog perguntar: quem compõe as comissões de
sindicância e investigação constituídas pelas Forças Armadas e
anunciadas por elas para apurar a tortura e outros crimes, assassinatos
inclusive, cometidos em sete quarteis e outras instalações delas em São
Paulo, Rio, Belo Horizonte e Recife?
E por que os militares não constituem comissões de sindicância e
investigação mistas, com representantes de entidades que cobram essa
apuração, da Comissão Nacional da Verdade, familiares das vítimas
torturadas e assassinadas nesses locais? Estas comissões não ficariam
mais isentas e imparciais e seus resultados — prometidos pelo ministro
da Defesa, Celso Amorim, para daqui a um mês — com maior credibilidade?
*comtextolivre
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