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Ser de esquerda é não aceitar as injustiças, sejam elas quais forem, como um fato natural. É não calar diante da violação dos Direitos Humanos, em qualquer país e em qualquer momento. É questionar determinadas leis – porque a Justiça, muitas vezes, não anda de mãos dadas com o Direito; e entre um e outro, o homem de esquerda escolhe a justiça.
É ser guiado por uma permanente capacidade de se estarrecer e, com ela e por causa dela, não se acomodar, não se vender, não se deixar manipular ou seduzir pelo poder. É escolher o caminho mais justo, mesmo que seja cansativo demais, arriscado demais, distante demais. O homem de esquerda acredita que a vida pode e deve ser melhor e é isso, no fundo, que o move. Porque o homem de esquerda sabe que não é culpa do destino ou da vontade divina que um bilhão de pessoas, segundo dados da ONU, passe fome no mundo.
É caminhar junto aos marginalizados; é repartir aquilo que se tem e até mesmo aquilo que falta, sem sacrifício e sem estardalhaço. À direita, cabe a tarefa de dar o que sobra, em forma de esmola e de assistencialismo, com barulho e holofotes. Ser de esquerda é reconhecer no outro sua própria humanidade, principalmente quando o outro for completamente diferente. Os homens e mulheres de esquerda sabem que o destino de uma pessoa não deveria ser determinado por causa da raça, do gênero ou da religião.
Ser de esquerda é não se deixar seduzir pelo consumismo; é entender, como ensinou Milton Santos, que a felicidade está ancorada nos bens infinitos. É mergulhar, com alegria e inteireza, na luta por um mundo melhor e neste mergulho não se deixar contaminar pela arrogância, pelo rancor ou pela vaidade. É manter a coerência entre a palavra e a ação. É alimentar as dúvidas, para não cair no poço escuro das respostas fáceis, das certezas cômodas e caducas. Porém, o homem de esquerda não faz da dúvida o álibi para a indiferença. Ele nunca é indiferente. Ser de esquerda é saber que este “mundo melhor e possível” não se fará de punhos cerrados nem com gritos de guerra, mas será construído no dia-a-dia, nas pequenas e grandes obras e que, muitas vezes, é preciso comprar batalhas longas e desgastantes. Ser de esquerda é, na batalha, não usar os métodos do inimigo.
Fernando Evangelista

sábado, abril 12, 2014

Para a PM de São Paulo, a desmilitarização é parte de um grande complô comunista




por : Mauro Donato

Coronel reformado, Adilson Paes de Souza tem sido uma voz bastante ativa na defesa da desmilitarização das polícias brasileiras.
Agora, a Polícia Militar de São Paulo resolveu enviar uma nota oficial rebatendo suas opiniões, buscando desqualificá-lo e a quem concorda com ele.

A PM preferiu ir pelo viés ideológico.
Para a instituição, o correto talvez seja uma imensa fogueira como as retratadas no filme “Fahrenheit 451″, de modo a que a “intelectualidade” fique sujeita aos valores da Tradição, Família e Propriedade. O filme, baseado na obra de Ray Bradbury, descreve um governo totalitário que proíbe qualquer livro, prevendo que o povo possa ficar instruído e se rebelar contra o status quo. As pessoas só têm acesso à informação através da TV. Era assim no nazismo.
Na resposta da PM, a “ideia” de desmilitarização está vinculada ao grande plano comunista em marcha.
“Muito provavelmente a resposta esteja em outro século e em outro continente, nascida da cabeça de alguém que pregou a difusão de um modelo hegemônico, que se deve construir espalhando intelectuais em partidos, universidades, meios de comunicação. Em seguida, minando estruturas básicas e sólidas de formação moral, como família, escola e religião”, diz a nota.
Intelectuais são um perigo, correto? Veja como prossegue: “Se não fosse terrível, seria cômico, porque denota, sim, a construção de um pensamento que se pretende coletivo, a partir de pessoas que se sentem intelectuais.” A intelectualidade é um sentimento?
“Em que mundo esses ‘especialistas’ fundamentam suas teorias?”, pergunta o comunicado.
A questão da desmilitarização vem promovendo debates numa periodicidade quase quinzenal com a comunhão de vários movimentos sociais em torno do tema. Sobretudo coletivos da periferia e da comunidade negra. São os “especialistas” em tratamento oferecido pela PM.
As práticas adotadas pela instituição variam conforme a região da cidade, a cor de pele do “suspeito” e da idade do “meliante”. O estudo da UFSCar mostrado no DCM na semana passada confirma isso. Não se trata de “achismo”, “fundamentalismo”, “comunismo” ou qualquer outra teoria de conspiração que a PM queira desenvolver.
Nem mesmo quando busca demonstrar senso crítico a nota sensibiliza. “Somos a instituição que mais depura seu público interno, sujeita a regulamentos, códigos rígidos de conduta e com uma corregedoria implacável contra agressores de policiais e contra policiais bandidos.”
Mas passados 21 anos do massacre do Carandiru, a Polícia Militar do Estado de São Paulo não moveu nenhum processo administrativo disciplinar contra os homens que atuaram naquele dia 2 de outubro de 1992. O processo no qual 73 policiais militares já condenados (a maioria hoje aposentada), foi pelo tocado pelo Ministério Público. Nenhum deles foi punido pela corporação, nem recebeu qualquer tipo de anotação em suas fichas profissionais.
Só isso já traduz o quanto a corporação está dissociada dos anseios da sociedade.
A nota da PM mais pareceu um manifesto da Marcha da Família a ser lido por Rachel Sheherazade sobre o caminhão de som.

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