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Ser de esquerda é não aceitar as injustiças, sejam elas quais forem, como um fato natural. É não calar diante da violação dos Direitos Humanos, em qualquer país e em qualquer momento. É questionar determinadas leis – porque a Justiça, muitas vezes, não anda de mãos dadas com o Direito; e entre um e outro, o homem de esquerda escolhe a justiça.
É ser guiado por uma permanente capacidade de se estarrecer e, com ela e por causa dela, não se acomodar, não se vender, não se deixar manipular ou seduzir pelo poder. É escolher o caminho mais justo, mesmo que seja cansativo demais, arriscado demais, distante demais. O homem de esquerda acredita que a vida pode e deve ser melhor e é isso, no fundo, que o move. Porque o homem de esquerda sabe que não é culpa do destino ou da vontade divina que um bilhão de pessoas, segundo dados da ONU, passe fome no mundo.
É caminhar junto aos marginalizados; é repartir aquilo que se tem e até mesmo aquilo que falta, sem sacrifício e sem estardalhaço. À direita, cabe a tarefa de dar o que sobra, em forma de esmola e de assistencialismo, com barulho e holofotes. Ser de esquerda é reconhecer no outro sua própria humanidade, principalmente quando o outro for completamente diferente. Os homens e mulheres de esquerda sabem que o destino de uma pessoa não deveria ser determinado por causa da raça, do gênero ou da religião.
Ser de esquerda é não se deixar seduzir pelo consumismo; é entender, como ensinou Milton Santos, que a felicidade está ancorada nos bens infinitos. É mergulhar, com alegria e inteireza, na luta por um mundo melhor e neste mergulho não se deixar contaminar pela arrogância, pelo rancor ou pela vaidade. É manter a coerência entre a palavra e a ação. É alimentar as dúvidas, para não cair no poço escuro das respostas fáceis, das certezas cômodas e caducas. Porém, o homem de esquerda não faz da dúvida o álibi para a indiferença. Ele nunca é indiferente. Ser de esquerda é saber que este “mundo melhor e possível” não se fará de punhos cerrados nem com gritos de guerra, mas será construído no dia-a-dia, nas pequenas e grandes obras e que, muitas vezes, é preciso comprar batalhas longas e desgastantes. Ser de esquerda é, na batalha, não usar os métodos do inimigo.
Fernando Evangelista

domingo, abril 06, 2014

Brasil é dos países do G20 que menos taxa ricos



Brasil é dos países do G20 que menos taxa ricos

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Elite vive reclamando do excesso de impostos, mas estudos indicam que os pobres são os que mais contribuem para custear serviços públicos no Brasil
Por TFF Brasil, com informações da BBC
Levantamento da PricewaterhouseCoopers (PwC) feito com exclusividade para a BBC Brasil revela que o imposto de renda cobrado da classe média alta e dos ricos no Brasil é menor que o praticado na grande maioria dos países do G20 – grupo que reúne as 19 nações de maior economia do mundo mais a União Europeia.
A consultoria comparou três faixas de renda anual: 70 mil libras, 150 mil libras e 250 mil libras – renda média mensal de cerca de R$ 23 mil, R$ 50 mil e R$ 83 mil, respectivamente, valores que incorporam mensalmente o 13º salário, no caso dos que o recebem. Nas três comparações, os brasileiros pagam menos imposto de renda do que a maioria dos contribuintes dos 19 países do G20.
Nas duas maiores faixas de renda analisadas, o Brasil é o terceiro país de menor alíquota. O contribuinte brasileiro que ganha mensalmente, por exemplo, cerca de R$ 50 mil, fica com 74% desse valor após descontar o imposto. Na média dos 19 países, o que resta após o pagamento do imposto é 67,5%.
Já na menor faixa analisada, o Brasil é o quarto país que menos taxa a renda, embora nesse caso a distância em relação aos demais diminua. Quem ganha por ano o equivalente a 75 mil libras (cerca de R$ 23 mil por mês), tem renda líquida de 75,5% no Brasil e de 72% na média do G20.
As maiores alíquotas são típicas de países europeus, onde há sistemas de bem-estar social consolidados, mas estão presentes também em alguns países emergentes.

Na Itália, por exemplo, praticamente metade da renda das pessoas de classe média alta ou ricas vai para os cofres públicos. Na Índia, cerca de 40% ou mais, assim como no Reino Unido e na África do Sul, quando consideradas as duas faixas de renda mais altas em análise.
CARGA ALTA
Apesar de a comparação internacional revelar que os brasileiros mais abastados pagam menos imposto de renda, a carga tributária brasileira – ou seja, a relação entre tudo que é arrecadado em tributos e a renda total do país (o PIB) – é mais alta do que a média.
Na média do G20, 26% da renda gerada no país vão para os governos por meio de impostos, enquanto no Brasil o índice é de 35%, mostram dados compilados pela Heritage Foundation. No grupo, apenas os países da Europa ocidental têm carga tributária maior – França e Itália são as campeãs, com mais de 40%.
O que está por trás do tamanho da carga tributária brasileira é o grande volume de impostos indiretos, ou seja, tributos que incidem sobre produção e comercialização – que no fim das contas são repassados ao consumidor final.
Segundo dados do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), impostos indiretos representam cerca de 40% da carga tributária brasileira, enquanto os diretos (impostos sobre renda e capital) são 28%. Contribuições previdenciárias são outra parcela relevante.
O grande problema é que esses impostos indiretos são iguais para todos e por isso acabam, proporcionalmente, penalizando os mais pobres. Por exemplo, o tributo pago quando uma pessoa compra um saco de arroz ou um bilhete de metrô será o mesmo, independentemente de sua renda. Logo, significa uma proporção maior da remuneração de quem ganha menos.
O governo taxa mais a produção e o consumo porque esse tipo de tributo é mais fácil de fiscalizar que o cobrado sobre a renda, observa o presidente do Instituto Brasileiro de Planejamento e Tributação, João Eloi Olenike. “De tanto se preocupar em combater a sonegação, o governo acaba criando injustiças tributárias”, afirma.
CONCENTRAÇÃO DE RENDA
Os governos federal, estaduais e municipais administram juntos uma fatia muito relevante da renda nacional. Por isso, a forma como arrecadam e gastam tem impacto direto na distribuição de renda.
Se por um lado os benefícios sociais e os gastos com saúde e educação públicas contribuem para a redução da desigualdade, o fato do poder público taxar proporcionalmente mais os pobres significa que ao arrecadar os tributos atua no sentido oposto, de concentrar renda.
Um estudo de economistas do Ipea e da Fundação Getulio Vargas (FGV) mostra que, no Brasil, o Índice de Gini – indicador que mede a concentração de renda – sobe após a arrecadação de impostos e recua após os gastos públicos.
Segundo estimativas com dados de 2009, o índice era de 0,591, ao se considerar a renda original da população (antes do recebimento de benefícios sociais e tributos). O número recuava para 0,560 após o pagamento de benefícios como aposentadorias, pensões e Bolsa Família, mas subia novamente para 0,565 após considerar o pagamento de tributos.
O índice volta a cair após se analisar os impactos dos gastos públicos que mais reduzem a distribuição de renda, as despesas com saúde e educação, já que a maioria dos beneficiários desses serviços são os mais pobres. A partir de dados oficiais sobre o uso desses serviços, os economistas estimaram que esses gastos públicos reduziam o índice de Gini para 0,479 em 2009.
O saldo geral disso tudo é que, após o governo arrecadar e gastar, a desigualdade de renda caía 19% naquele ano. Mas num país tão desigual, a queda precisa ser maior, afirma Fernando Gaiger, um dos autores da pesquisa: “O tributo tem uma função de coesão social”.
Não há boas comparações internacionais recentes disponíveis para a questão, mas um estudo de anos atrás do Banco Mundial indica que, em países europeus, a queda da desigualdade é de mais de 30% após a intervenção do Estado, mesmo sem se considerar os gastos em saúde e educação.
MUDANÇAS NOS IMPOSTOS
Os quatro especialistas ouvidos pela BBC Brasil defenderam a redução dos impostos indiretos, que penalizam mais os pobres, e a elevação da taxação sobre renda, propriedade e herança. “Seria uma questão de justiça tributária”, diz o especialista em contas públicas Mansueto Almeida.
Gaiger, por exemplo, propõe que haja mais duas alíquotas de Imposto de Renda – uma de 35% para quem ganha por mês entre R$ 6 mil e R$ 13,7 mil e outra de 45% para quem recebe mais que isso.
Hoje, a taxa máxima é de 27,5%, para todos que recebem acima de R$ 4.463,81. Muitos não sabem, mas essas alíquotas são “marginais”. Ou seja, apenas a parcela da renda acima desse limite é tributado pela alíquota máxima, não a renda toda.
No entanto, os especialistas observam que, embora seja justo ter mais alíquotas, isso não tem impacto relevante em termos de arrecadação, porque uma parcela muito pequena da população tem renda dessa magnitude. Segundo o IBGE, apenas 111.893 pessoas em todo o país disseram ao Censo de 2010 receber mais de R$ 20 mil por mês. (23.554 recebem mais de R$ 45 mil por mês e 11.851 recebem acima de R$ 75 mil por mês.)
O mais importante, defendem, é reduzir as possibilidades de descontos no Imposto de Renda. Hoje, por exemplo, é possível abater do imposto devido gastos privados com saúde e educação. Na prática, isso significa que o Estado está subsidiando serviços privados justamente para a parcela da população de maior renda, ou seja, que precisa menos. “É o bolsa rico”, diz Gaiger.
Para 2014, a previsão é de que a Receita Federal deixará de arrecadar R$ 35,2 bilhões por causas de descontos e isenções desse tipo. Desse total, R$ 10,7 bilhões são deduções de gastos com saúde e R$ 4,1 bilhão de gastos com educação – somados, equivalem a 13% do total dos gastos federais previstos para as duas áreas neste ano (R$ 113,6 bilhões).
IMPOSTOS DEMAIS?
Apesar de ser lugar comum criticar o tamanho da carga tributária do Brasil, estudiosos do tema dizem que não há um número ideal.
“O tamanho da carga é uma escolha da sociedade. Se as pessoas quiserem serviços públicos universais e benefícios sociais, o recolhimento de impostos terá que ser maior. Se quisermos que a educação e a saúde sejam apenas privadas, por exemplo, a carga poderá ser menor”, observa Samuel Pessoa, da FGV.
Na sua avaliação, a discussão mais importante não é a redução da carga tributária, mas mudar sua estrutura e simplificá-la, para diminuir as desigualdades e reduzir os custos das empresas com burocracia
*Forum

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