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Ser de esquerda é não aceitar as injustiças, sejam elas quais forem, como um fato natural. É não calar diante da violação dos Direitos Humanos, em qualquer país e em qualquer momento. É questionar determinadas leis – porque a Justiça, muitas vezes, não anda de mãos dadas com o Direito; e entre um e outro, o homem de esquerda escolhe a justiça.
É ser guiado por uma permanente capacidade de se estarrecer e, com ela e por causa dela, não se acomodar, não se vender, não se deixar manipular ou seduzir pelo poder. É escolher o caminho mais justo, mesmo que seja cansativo demais, arriscado demais, distante demais. O homem de esquerda acredita que a vida pode e deve ser melhor e é isso, no fundo, que o move. Porque o homem de esquerda sabe que não é culpa do destino ou da vontade divina que um bilhão de pessoas, segundo dados da ONU, passe fome no mundo.
É caminhar junto aos marginalizados; é repartir aquilo que se tem e até mesmo aquilo que falta, sem sacrifício e sem estardalhaço. À direita, cabe a tarefa de dar o que sobra, em forma de esmola e de assistencialismo, com barulho e holofotes. Ser de esquerda é reconhecer no outro sua própria humanidade, principalmente quando o outro for completamente diferente. Os homens e mulheres de esquerda sabem que o destino de uma pessoa não deveria ser determinado por causa da raça, do gênero ou da religião.
Ser de esquerda é não se deixar seduzir pelo consumismo; é entender, como ensinou Milton Santos, que a felicidade está ancorada nos bens infinitos. É mergulhar, com alegria e inteireza, na luta por um mundo melhor e neste mergulho não se deixar contaminar pela arrogância, pelo rancor ou pela vaidade. É manter a coerência entre a palavra e a ação. É alimentar as dúvidas, para não cair no poço escuro das respostas fáceis, das certezas cômodas e caducas. Porém, o homem de esquerda não faz da dúvida o álibi para a indiferença. Ele nunca é indiferente. Ser de esquerda é saber que este “mundo melhor e possível” não se fará de punhos cerrados nem com gritos de guerra, mas será construído no dia-a-dia, nas pequenas e grandes obras e que, muitas vezes, é preciso comprar batalhas longas e desgastantes. Ser de esquerda é, na batalha, não usar os métodos do inimigo.
Fernando Evangelista

quinta-feira, abril 17, 2014

 A desinformação como estratégia


O cidadão brasileiro que assiste aos telejornais, lê regularmente um diário e ouve os noticiosos do rádio se considera, provavelmente, um indivíduo bem informado. Essa percepção é apanhada em pesquisas — que alguns estatísticos chamariam mais apropriadamente de consultas — feitas rapidamente em cima dos fatos.

É o caso típico do apanhado sobre violência contra mulheres, que tanta polêmica provocou por causa de um erro primário cometido pelo Ipea – Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada. Depois de toda a celeuma, um diretor do instituto vem a público observar que faltam dados no Brasil para a criação de políticas públicas contra a violência sexual, entre outras razões porque não há cruzamento de dados entre as polícias, os institutos de medicina legal e o Ministério da Saúde.

Ora, dirá então o leitor ou a leitora atentos e críticos: se nem as instituições oficiais conhecem a natureza e o tamanho do problema, qual é a base de informação do cidadão anônimo que é interpelado por um pesquisador para dar sua opinião?

Isso posto, poderíamos conversar durante horas sobre o fato evidente de que a maior parte daquilo que é apresentado como “opinião pública” pela imprensa não passa de um retrato instantâneo de certo estado emocional provocado pelo impacto do noticiário. E o noticiário, como sabemos, é definido pelo potencial de espetáculo que cada elemento de informação é capaz de produzir. Assim, um escândalo de R$ 10 milhões no âmbito federal é mais valioso do que um malfeito de R$ 100 milhões na instância do município ou do estado, dependendo, é claro, de quem seja o governante da ocasião.

Uma consulta à opinião média das grandes cidades brasileiras talvez resultasse na percepção de que o Brasil está imerso num turbilhão inflacionário, que o desemprego assombra as famílias e que a Petrobras está à beira da falência. Essa interpretação falsa é induzida diariamente pelas manchetes dos diários e pelas performances dramáticas dos atores que trabalham como âncoras de telejornais.

Onde estaria a verdade?

Um mau negócio

A verdade, ou o ponto da espiral de conceitos que mais se aproxima dela, certamente não se encontra nos textos da mídia hegemônica. Também não é provável que esteja presente, em sua inteireza, naquela outra mídia, chamada alternativa, politicamente engajada, que atua basicamente pela lógica do confronto. É muito possível, portanto, que a sociedade brasileira esteja contaminada pelo perigoso vírus da desinformação, que se torna muito mais nocivo quanto maior for o valor simbólico da opinião.

O escândalo em torno da Petrobras, por exemplo, tem base concreta num fato demonstrado pela Polícia Federal — o envolvimento de pelo menos um ex-diretor com o esquema criminoso cuja chefia é atribuída ao doleiro Alberto Youssef — mas é amplificado por uma ruidosa operação de desinformação. A sucessão de notícias, com depoimentos de protagonistas do caso a um plenário de parlamentares ávidos por publicidade, apenas aumenta a confusão e a desinformação.

Em nota oficial publicada na quinta-feira (17/4) no Globo, mas não disponível online na manhã desse dia, a Petrobras oferece uma série de esclarecimentos que os jornais omitem. O site da empresa já havia divulgado, em junho de 2012, uma resposta a reportagem sobre o mesmo assunto publicada no Estado de S. Paulo (ver aqui), sob o título “Petrobras poderá ter perda milionária nos Estados Unidos”, na qual estão disponíveis os dados apresentados nesta semana à Câmara dos Deputados (ver aqui).

No site da Petrobras (ver aqui) é possível acompanhar toda a história da compra da refinaria, por meio do antigo blog fatosedados e nos comunicados a investidores. Ali o leitor encontra as respostas que a imprensa omite e conclui que foi um mau negócio, que parecia bom na ocasião e se revelou um equívoco com a descoberta do pré-sal — como muitos negócios que grandes e pequenas empresas costumam ter em seus portfólios. Mas percebe também o quanto de desinformação é despejada sobre sua cabeça diariamente pelos jornais.

Essa desinformação não decorre de um erro coletivo da imprensa: é parte de uma estratégia.

Luciano Martins Costa

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