Além dos desafios diretos, usuários de crack têm de enfrentar falta de limites da mídia- "Mulher recrutada pelo programa Braços Abertos tem crise de choro e revolta após jornal publicar sua foto usando a droga na primeira página" _+_Exclusiva: Dona Zelite abre o verbo contra os rolezinhos
Orgulho: Vanda e seu companheiro Tim posam para foto. Antes do início da frente de trabalho eles se recusavam |
Gisele Brito, RBA
Estampada na capa de um dos jornais de maior circulação do país fumando
crack, Maria (nome fictício) passou a manhã de hoje (17) chorando
enfurecida no hall do hotel em que está hospedada na rua Dino Bueno, na
região conhecida como cracolândia, no centro de São Paulo.
Ela foi flagrada por um fotógrafo ontem, no primeiro dia da frente de
trabalho, usando a droga ainda com parte do uniforme do programa Braços
Abertos, da prefeitura.
O programa prevê hospedagem em hotéis conveniados da região, a oferta de
três refeições gratuitas por dia e a contratação para serviço de
varrição e zeladoria com carga de 4 horas diárias, mais duas de
qualificação e salário de R$ 15 por dia de trabalho.
Segundo a prefeitura, o objetivo do projeto é retirar os usuários do
vício, mas eles não estão obrigados a parar de imediato com o uso da
droga.
Ao lado de uma amiga, também usuária, Maria lamenta a “invasão de
privacidade”. “Nunca vi isso, tirar foto de uma pessoa e colocar assim
na capa do jornal. Eu fiquei triste assim desse jeito, porque eu estou
acreditando mesmo nesse projeto e isso pode atrapalhar para todo mundo. O
pessoal já tá dizendo que vão me furar porque eu estou arrastando”,
conta.
Na gíria, 'arrastar' tem o sentido de prejudicar. “Mas quando eu tiver
condições vou processar quem fez a foto e arrancar muito dinheiro
deles”, planeja.
Os usuários não gostam de tirar fotos. Os profissionais de TV, Internet e
mídia impressa são o tempo todo orientados a não registrar rostos. O
tom muitas vezes é ameaçador e alguns chegam a jogar pedras contra
equipamentos. A razão, explicam, é preservar a família.
“Imagina quem tem mãe, pai, que às vezes nem sabe que você está nessa
situação ou que sabe, mas não precisa ver você toda suja, usando pedra. E
tem os que têm filho que não entende que isso é um vício”, explica
Vandeilda Benedito da Silva, a Vanda, que depois de três dias de
conversa com a RBA topou tirar uma foto ontem, orgulhosa por estar
vestindo o uniforme da Frente de Trabalho. “Agora pode porque se minha
mãe me vê vestida assim, com certeza vai ficar orgulhosa”, explicou.
A revolta de Maria foi acompanhada por profissionais de saúde,
educadores da ONG Brasil Gigante e outros frequentadores da cracolândia.
“O que eles querem é fazer de tudo para acabar com o projeto, deixar
vocês abandonados aqui. Não pode dar brecha”, aproveitava a deixa um dos
educadores, que não quis se identificar.
“Vocês que estão no hotel têm que fazer uma assembleia e decidir o que
acham certo e o que acham errado fazer aqui dentro, assim ninguém se
prejudica”, sugeriu."
*Ajusticeiradeesquerda
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