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Ser de esquerda é não aceitar as injustiças, sejam elas quais forem, como um fato natural. É não calar diante da violação dos Direitos Humanos, em qualquer país e em qualquer momento. É questionar determinadas leis – porque a Justiça, muitas vezes, não anda de mãos dadas com o Direito; e entre um e outro, o homem de esquerda escolhe a justiça.
É ser guiado por uma permanente capacidade de se estarrecer e, com ela e por causa dela, não se acomodar, não se vender, não se deixar manipular ou seduzir pelo poder. É escolher o caminho mais justo, mesmo que seja cansativo demais, arriscado demais, distante demais. O homem de esquerda acredita que a vida pode e deve ser melhor e é isso, no fundo, que o move. Porque o homem de esquerda sabe que não é culpa do destino ou da vontade divina que um bilhão de pessoas, segundo dados da ONU, passe fome no mundo.
É caminhar junto aos marginalizados; é repartir aquilo que se tem e até mesmo aquilo que falta, sem sacrifício e sem estardalhaço. À direita, cabe a tarefa de dar o que sobra, em forma de esmola e de assistencialismo, com barulho e holofotes. Ser de esquerda é reconhecer no outro sua própria humanidade, principalmente quando o outro for completamente diferente. Os homens e mulheres de esquerda sabem que o destino de uma pessoa não deveria ser determinado por causa da raça, do gênero ou da religião.
Ser de esquerda é não se deixar seduzir pelo consumismo; é entender, como ensinou Milton Santos, que a felicidade está ancorada nos bens infinitos. É mergulhar, com alegria e inteireza, na luta por um mundo melhor e neste mergulho não se deixar contaminar pela arrogância, pelo rancor ou pela vaidade. É manter a coerência entre a palavra e a ação. É alimentar as dúvidas, para não cair no poço escuro das respostas fáceis, das certezas cômodas e caducas. Porém, o homem de esquerda não faz da dúvida o álibi para a indiferença. Ele nunca é indiferente. Ser de esquerda é saber que este “mundo melhor e possível” não se fará de punhos cerrados nem com gritos de guerra, mas será construído no dia-a-dia, nas pequenas e grandes obras e que, muitas vezes, é preciso comprar batalhas longas e desgastantes. Ser de esquerda é, na batalha, não usar os métodos do inimigo.
Fernando Evangelista

terça-feira, janeiro 21, 2014

MIRUNA AGRADECE SOLIDARIEDADE DOS BRASILEIROS À SEU PAI, EX-GUERRILHEIRO DO POVO, JOSÉ GENOINO


especial para Rede Brasil Atual
 
Brasília – Quando eu tinha por volta de 13, 14 anos, comecei a ter consciência de tudo o que meu pai e minha mãe tinham feito na época da ditadura. Abriram mão de família, amigos, conforto, estabilidade e entraram em clandestinidade, fuga, medo, prisão e tortura porque não duvidaram um minuto sobre de que lado estavam: o de quem lutava pela liberdade para todos. Apesar de ser para mim claro o fato de que tinham lutado por algo sem dúvida muito importante, sempre me vinha à mente uma pergunta: será que se eu vivesse naquela época, teria tido coragem de fazer tudo isso? Será que eu teria tido essa força? Será?
Hoje percebo que em alguns momentos da vida não temos escolha quanto a tomar essa ou aquela decisão, quando tudo em que acreditamos está em risco, seja, como naquela época, a liberdade, seja, como agora, a justiça para uma pessoa honesta, como meu amado pai, José Genoino Neto. Ao longo de mais de oito anos de martírio e sofrimento, foram muitas as situações de desespero, de angústia e de muita, muita solidão.
E por isso, quando de repente percebemos pequenos espaços de luz e força que vão se abrindo e se construindo por meio de atitudes generosas de tantas pessoas, o alívio e a emoção são sentimentos que ocupam totalmente tudo aquilo que pensamos e vemos acontecer nessa trilha tão difícil que temos percorrido nos últimos tempos.
Gostaria de mencionar uma grande amiga que no dia 15 de novembro levou meus filhos para passear, dispondo de seu tempo para nos ajudar a lidar com toda a perseguição que estávamos sofrendo na casa sitiada pela mídia. Com seu pequeno gesto, poupou duas crianças de 7 e de 5 anos, de presenciar o momento em que o avô saiu de casa para ser preso injustamente.
Aquele gesto, de dar carinho e acolhimento para meus filhos, quando eu apenas podia ser filha, e não mãe, vai marcar sempre minha vida e meu coração, porque mostra que mesmo em meio a tanta desgraça, sempre existe o lado da humanidade pura, bondosa, generosa, e capaz de acolher, verdadeiramente.
Esse gesto pequeno, individual, pode ser comparado ao que estamos vivendo agora, com a multa imposta a meu pai em decorrência de sua condenação injusta. No primeiro momento de desespero, pelo valor solicitado, tão enormemente distante de nossas possibilidades, já surgia um primeiro site que se dispôs a unir muita gente e assim iniciar uma primeira arrecadação para meu pai. 
E ainda que aquele site não tenha seguido em frente por questões técnicas, acredito profundamente que foi uma ação que nos deu força para prepararmos o segundo site que possibilitou a arrecadação do valor total da multa.
Foram muitas doações, muitas. Pessoas que dedicaram parte de seu tempo para enviar a nós R$ 10, R$ 20, R$ 50, R$ 100 reais, às vezes mais, R$ 1.000, R$ 5.000... e mensagens, muitas mensagens, de carinho e solidariedade.
Aposentados, desempregados, professores, advogados, secretárias, jornalistas, dentistas, bordadeiras, gente, muita gente, que quis de alguma maneira, mostrar que estão conosco, que sabem que apenas assim poderíamos pagar esta enorme multa, porque José Genoino nunca acumulou riqueza material, nunca, ainda que alguns tenham tido coragem de condená-lo por corrupção. Sua riqueza é apenas de ideias, de sonhos, de esperança, de verdade e de justiça – que um dia, de alguma forma, acreditamos que chegará.
Essa campanha foi criada pela mulher e pelos filhos de José Genoino. Nós mesmos elaboramos e escrevemos cada uma das palavras que aparecem no site. Nós mesmos mandamos os e-mails a amigos e familiares contando sobre o início desse pedido de ajuda. Nós mesmos fomos em busca de tentar compreender e organizar toda a burocracia necessária para que tal arrecadação desse certo.
E com a ajuda de amigos queridos, que nunca deixaremos de agradecer, fomos lendo os e-mails um a um, cadastrando cada pessoa, respondendo cada mensagem, ainda que, pela forma familiar de ação, esteja acontecendo em uma velocidade nem sempre compreendida por um mundo sempre recheado de grandes grupos administrando eficazmente grandes gestões e situações. 
Nossa resposta não é automática, mas sim manual, e foi feita por outras tantas pessoas especiais que também dedicaram seu tempo e sua alma, para permitir que a campanha funcionasse.
Alcançamos o valor da multa em dez dias de campanha familiar. Essa é uma vitória que tem um significado enorme dentro de nossa incansável luta em busca de verdadeira justiça para José Genoino. Em nome dele, que está impedido de falar publicamente, precisamos agradecer com toda a intensidade possível a todas essas pessoas que tornaram esse momento de vitória possível.
A você, que contribuiu. A você que divulgou o site. A você que respondeu os emails. A você que nos informou. A você que escreveu honestamente sobre nós. A você que são tantos vocês, nosso agradecimento por não terem tido nenhuma dúvida de que sim, quando chega o momento de dificuldade, vocês são daquele grupo de pessoas que têm coragem de lutar por algo que é verdadeiro e no qual acreditam. De verdade.

Obrigado, sempre.

Miruna Genoino, em nome da família Genoino

Brasília, 19 de janeiro de 2014

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