Valor da multa a Genoino extrapola os parâmetros legais
Doações atingiram nesta quarta-feira, 15, R$ 399.762,94. Ou seja, quase 60% dos R$ 667,5 mil estipulados pela Justiça |
Na nota Campanha para Genoino já arrecadou R$295 mil, 44% da multa, o
leitor Luís Carlos, nos comentários, questionou: “Sendo o único imóvel
dele e que é usado para moradia realmente, poderia ser tirado da
família para pagar essa multa?” A dúvida de Elza, também nos
comentários, era outra: “Pra onde vai o dinheiro dessas multas?”
Nesta quarta-feira, 15, conversamos sobre essas e outras questões
referentes à multa com o advogado Patrick Mariano, mestre em Direito,
Estado e Constituição pela Universidade de Brasília (UnB) UnB e
integrante da Rede Nacional de Advogados e Advogadas Populares – Renap.
Antes da nossa entrevista, uma boa notícia. A campanha de doações para
José Genoino pagar a multa da Ação Penal 470 atingiu nesta
quarta-feira, 15, R$ 399.762,94. Ou seja, quase 60% dos R$ 667,5 mil estipulados pela Justiça.
Viomundo — O Genoino tem um único
imóvel, que onde ele e a família realmente moram. A União poderá cobrar
a dívida judicialmente, inclusive confiscando o sobrado da família, no
bairro do Butantã, em São Paulo?
Patrick Mariano — Não. A Lei 8.009/90 prevê que “o imóvel
residencial próprio do casal, ou da entidade familiar, é impenhorável e
não responderá por qualquer tipo de dívida civil, comercial, fiscal,
previdenciária ou de outra natureza, contraída pelos cônjuges ou pelos
pais ou filhos que sejam seus proprietários e nele residam”.
Viomundo — O entendimento do Supremo Tribunal Federal (STF) é nesse sentido?
Patrick Mariano – Tanto no STF quanto no Superior Tribunal de
Justiça (STJ) o entendimento é o que está lei Lei 8.009/90. É essa Lei
que protege o bem de família.
Viomundo — E se o apenado tiver mais de um imóvel ou outros bens, o que determina alei?
Patrick Mariano – Se possuir mais de um imóvel, a
impenhorabilidade recairá sobre o de menor valor, caso, no Registro de
Imóveis, não exista a escolha para este fim de outro bem.
Viomundo — O que acontece se o condenado não pagar a multa? Tem interferência na pena ou na progressão do regime?
Patrick Mariano – Uma vez transitada em julgado a ação, ou
seja, não couber mais nenhum recurso, o fato do condenado não
conseguir pagar a multa não terá efeito algum na sua pena.
A Lei 9.260/96 alterou a redação do Código Penal e proibiu a conversão
da pena de multa em detenção. O inadimplemento da pena de multa permite
apenas que ela seja considerada dívida de valor, tornando-se dívida
ativa da Fazenda Pública.
Viomundo — O juiz deu prazo até dia 20 para Genoino pagar a multa. É sempre tão exíguo o prazo?
Patrick Mariano – Com relação ao prazo parece que não há ilegalidade, pois o artigo 50 do Código Penal, fala em 10 dias a contar do trânsito em julgado.
Viomundo — O que é feito com o dinheiro da multa?
Patrick Mariano – A arrecadação vai para o Fundo Penitenciário
Nacional (ao Funpen). Entre outros fins, deve deve ser destinado
à construção, reforma, ampliação e aprimoramento de estabelecimentos
penais; manutenção dos serviços penitenciários; e formação,
aperfeiçoamento e especialização do serviço penitenciário.
Viomundo — Tem-se ideia de quanto se apurou no ano passado com esse tipo de multa?
Patrick Mariano — Dados do Funpen, divulgados em 2012, falam em torno de R$ 3 bilhões, desde a sua fundação, em 1994.
Viomundo — Que critérios devem ser
levados em consideração para fixação do valor da multa? Houve exagero
neste ponto no caso de Genoino?
Patrick Mariano – O artigo 60 do Código Penal é bem claro: na
fixação da pena de multa, o juiz deve atender, principalmente, à
situação econômica do réu.
Além disso, o artigo 50, também do Código Penal, diz que a pena de
multa não deve incidir sobre os recursos indispensáveis para o sustento
do condenado e sua família.
É de conhecimento de todos que José Genoino não é um homem de posses.
Ao contrário, reside na mesma casa há muitos anos. Nunca acumulou
patrimônio, vivendo do seu salário. Pelo que li, o valor da multa
imposto extrapolou — e muito! — os parâmetros legais.
Infelizmente, estamos diante de mais uma ilegalidade cometida.
Não é só isso. Está no artigo 5º, parágrafo XLV, da Constituição
brasileira de 1988: “nenhuma pena passará da pessoa do condenado”.
Ou seja, no caso de Genoino, não bastam a prisão e o degredo, já que
foi impedido de cumprir a pena próximo a sua família. A sanha punitiva e
o ódio de classe exposto na sentença foram além ao impor sofrimento
não só ao condenado, mas também à toda sua família que não tem como
pagar valores tão exorbitantes.
Desta forma, o drama de ter um familiar preso se soma ao desespero da
família em não ter como pagar a dívida. O que justificaria tamanha
tentação punitiva? Só se viu isso nos Tribunais da Inquisição, de triste
e trágica lembrança.
Conceição Lemes
No Viomundo
*comtextolivre
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