Páginas

Ser de esquerda é não aceitar as injustiças, sejam elas quais forem, como um fato natural. É não calar diante da violação dos Direitos Humanos, em qualquer país e em qualquer momento. É questionar determinadas leis – porque a Justiça, muitas vezes, não anda de mãos dadas com o Direito; e entre um e outro, o homem de esquerda escolhe a justiça.
É ser guiado por uma permanente capacidade de se estarrecer e, com ela e por causa dela, não se acomodar, não se vender, não se deixar manipular ou seduzir pelo poder. É escolher o caminho mais justo, mesmo que seja cansativo demais, arriscado demais, distante demais. O homem de esquerda acredita que a vida pode e deve ser melhor e é isso, no fundo, que o move. Porque o homem de esquerda sabe que não é culpa do destino ou da vontade divina que um bilhão de pessoas, segundo dados da ONU, passe fome no mundo.
É caminhar junto aos marginalizados; é repartir aquilo que se tem e até mesmo aquilo que falta, sem sacrifício e sem estardalhaço. À direita, cabe a tarefa de dar o que sobra, em forma de esmola e de assistencialismo, com barulho e holofotes. Ser de esquerda é reconhecer no outro sua própria humanidade, principalmente quando o outro for completamente diferente. Os homens e mulheres de esquerda sabem que o destino de uma pessoa não deveria ser determinado por causa da raça, do gênero ou da religião.
Ser de esquerda é não se deixar seduzir pelo consumismo; é entender, como ensinou Milton Santos, que a felicidade está ancorada nos bens infinitos. É mergulhar, com alegria e inteireza, na luta por um mundo melhor e neste mergulho não se deixar contaminar pela arrogância, pelo rancor ou pela vaidade. É manter a coerência entre a palavra e a ação. É alimentar as dúvidas, para não cair no poço escuro das respostas fáceis, das certezas cômodas e caducas. Porém, o homem de esquerda não faz da dúvida o álibi para a indiferença. Ele nunca é indiferente. Ser de esquerda é saber que este “mundo melhor e possível” não se fará de punhos cerrados nem com gritos de guerra, mas será construído no dia-a-dia, nas pequenas e grandes obras e que, muitas vezes, é preciso comprar batalhas longas e desgastantes. Ser de esquerda é, na batalha, não usar os métodos do inimigo.
Fernando Evangelista

sexta-feira, janeiro 03, 2014

O novo prefeito de Nova York e sua opção pelos pobres

 
Por : Paulo Nogueira

Diz o NY Times: “Ele deu voz aos nova-iorquinos esquecidos – os 46% que vivem na pobreza ou perto dela, os 50 000 sem teto, os milhões que estão fora das áreas de segurança econômica e afluência aristocrática.”

O Times estava se referindo a Bill de Blasio, 52 anos, democrata que se elegeu espetacularmente prefeito de Nova York. Surgido do nada dentro do mundo político americano, Blasio venceu as eleições com 40 pontos de diferença sobre o candidato republicano. Não foi uma vitória, foi um esmagamento.
Blasio se elegeu com a seguinte plataforma: combater a desigualdade social, combater a desigualdade social e ainda combater a desigualdade social.
Para isso, em sua plataforma estavam coisas como o aumento dos impostos para os ricos.
Pausa para uma reflexão: você vê algum candidato à presidência no Brasil falando em aumentar imposto dos ricos?
Bem, Blasio foi duramente atacado pela plutocracia novaiorquina. Vasculharam seu passado e brandiram contra ele um passado ativista no qual ele se colocou a favor dos sandinistas na Nicarágua. Até sua lua de mel em Cuba foi usada contra Blasio.
Mas os novaiorquinos não ouviram a elite financeira. E abarrotaram Blasio de votos numa vitória que, para muitos, simboliza o retorno aos Estados Unidos de uma coisa chamada ‘esquerda’. Blasio se declara um “socialista democrático”.
Blasio é uma figuraça. Ele é casado com uma mulher negra que, antes do casamento, só tivera relacionamentos lésbicos. Os dois têm dois filhos adolescentes, um menino e uma menina.
O garoto tem um cabelo afro que acabou virando destaque na mídia americana. Um vídeo em que o menino fala do pai viralizou nos Estados Unidos.
Blasio, de origem italiana, teve uma infância conturbada. O pai perdeu uma perna numa guerra e mesmo assim, ao voltar, foi perseguido pelo Estado, sob a acusação de ser comunista.
O homem se perdeu: passou a beber, se divorciou e se afastou da família. Acabou por se matar com um tiro de rifle no peito. “Com ele aprendi o que não fazer”, diz Blasio. Ele tirou o sobrenome paterno em sua vida profissional e ficou com o da mãe.
Blasio conta que teve conversas interessantes com empresários que o viam com desconfiança. A um deles, cujo avô era um homem sem nada, ele lembrou que em outros tempos gente pobre tinha oportunidade de ascender. “O empresário, ao lembrar do avô, entendeu o meu ponto”, diz Blasio.
Obama, que apoiou Blasio, foi uma enorme decepção para os pobres americanos.
Blasio parece ser diferente. Tem mais conteúdo e foi eleito para mitigar a desigualdade social. Ele falou muito na parábola de Dickens de “duas cidades” dentro de uma só, uma riquíssima e outra miserável. (É uma imagem absolutamente adequada ao Brasil.)
Num gesto notável, estendeu a mão para a comunidade islâmica de Nova York, alvo de espionagem constante depois do Onze de Setembro. Disse que a perseguição e o preconceito vão acabar em sua gestão.
Os novaiorquinos deram uma chance à sorte ao escolhê-lo maciçamente e preterir o candidato republicano sob o qual as “duas cidades” permaneceriam e, com elas, a pobreza abandonada de milhões de pessoas.
Parabéns, mais que a Blasio, aos novaiorquinos.

Nenhum comentário:

Postar um comentário