Serão os media apenas uma outra palavra para controle?
Via Resistir.info
“…A
maior parte dos sequestradores do 11/Set vieram da Arábia Saudita. Em
2010, a Wikileaks divulgou um telegrama enviado a embaixadas dos EUA
pela secretária de Estado Hilary Clinton. Ela escreveu isto: "A Arábia
Saudita permanece um apoio financeiro crítico para a Al Qaeda, os
Talibans, al Nusra e outros grupos terroristas... no mundo inteiro". E
ainda assim os sauditas são nossos valiosos aliados. Eles são bons
ditadores. Os membros da casa real britânica visitam-nos frequentemente.
Nós lhes vendemos todas as armas que eles querem.”
John Pilger [*]
Os
filhos do urânio empobrecido(deplet uranium:DU): vítimas, em Bassora do
envenamento químico, físico e radiológico praticado pelo imperialismo
anglo-americano no Iraque
Um inquérito recente
perguntou ao povo britânico quantos iraquianos foram mortos devido à
invasão do país em 2003. As respostas dadas foram chocantes. A maioria
disse que menos de 10 mil haviam sido mortos. Estudos científicos
informam que mais de um milhão de homens, mulheres e crianças iraquianos
morreram num inferno desencadeado pelo governo britânico e seu aliado
em Washington. Isso é o equivalente ao genocídio em Ruanda. E a
carnificina prossegue. Implacavelmente.
O que
isto revela é como nós na Grã-Bretanha temos sido enganados por aqueles
cujo trabalho é manter a informação correcta. O escritor e académico
americano Edward Herman chama a isto "normalizar o impensável". Ele
descreve dois tipos de vítimas no mundo das notícias: "vítimas valiosas"
e "vítimas não valiosas". "Vítimas valiosas" são aquelas que sofrem nas
mãos dos nossos inimigos: os tipos de Assad, Qadafi, Saddam Hussein.
"Vítimas valiosas" qualificam para o que chamamos "intervenção
humanitária". "Vítimas não valiosas" são aquelas que estorvam o caminho
do nosso poder punitivo e aquelas dos "bons ditadores" que empregamos.
Saddam Hussein foi outrora um "bom ditador" mas ficou arrogante e
desobediente, tendo então sido despromovido a "mau ditador".
Na
Indonésia, o general Suharto era um "bom ditador", pouco importando a
sua carnificina de cerca de um milhão de pessoas, ajudada pelos governos
da Grã-Bretanha e América. Ele também liquidou um terço da população de
Timor Leste com a ajuda de caça britânicos e metralhadoras britânicas.
Suharto foi mesmo saudado em Londres pela rainha e quando morreu
pacificamente na sua cama, foi louvado como alguém esclarecido, um
modernizador, um de nós. Ao contrário de Saddam Hussein, ele nunca se
tornou arrogante.
Quando viajei no Iraque na
década de 1990, os dois principais grupos muçulmanos, os xiitas e os
sunitas, tinham suas diferenças mas viviam lado a lado, casavam-se mesmo
entre si e consideravam-se com orgulho como iraquianos. Não havia Al
Qaida, não havia jihadistas. Nos arrebentámos tudo aquilo em 2003 com
"pavor e choque". E hoje sunitas e xiitas estão a combater-se por todo o
Médio Oriente. Este assassínio em massa está a ser financiado pelo
regime na Arábia Saudita que decapita pessoas e discrimina mulheres. A
maior parte dos sequestradores do 11/Set vieram da Arábia Saudita. Em
2010, a Wikileaks divulgou um telegrama enviado a embaixadas dos EUA
pela secretária de Estado Hilary Clinton. Ela escreveu isto: "A Arábia
Saudita permanece um apoio financeiro crítico para a Al Qaeda, os
Talibans, al Nusra e outros grupos terroristas... no mundo inteiro". E
ainda assim os sauditas são nossos valiosos aliados. Eles são bons
ditadores. Os membros da casa real britânica visitam-nos frequentemente.
Nós lhes vendemos todas as armas que eles querem.
Utilizou
a primeira pessoa do plural, "nós" e "nosso" de acordo com locutores e
comentadores que frequentemente utilizam o "nós", preferindo não
distinguir entre o poder criminoso dos nossos governos e nós, o público.
Todos nós somos assumidos como partes de um consenso: Conservadores e
Trabalhistas, a Casa Branca de Obama também. Quando Nelson Mandela
morreu, a BBC foi a correr a David Cameron, depois a Obama. Cameron, que
foi à África do Sul no 25º ano do aprisionamento numa viagem que
equivalia ao apoio ao regime do apartheid, e Obama que recentemente
derramou uma lágrima na cela de Mandela em Robben Island – ele que
preside as jaulas de Guantanamo.
O que
lamentavam eles quanto a Mandela? Evidentemente, não a sua
extraordinária vontade de resistir a um regime opressivo cuja perversão
os governos dos EUA e Grã-Bretanha apoiaram anos a fio. Ao invés disso,
estavam gratos pelo papel crucial que Mandela desempenhou na supressão
de um levantamento dos negros na África do Sul contra a injustiça da
política branca e do poder económico. Isto foi certamente a única razão
porque foi libertado. Hoje o mesmo poder económico implacável é
apartheid de uma outra forma, fazendo da África do Sul a sociedade mais
desigual da terra. Alguns chamam a isto "reconciliação".
Todos
nós vivemos numa era de informação – ou assim nos dizemos um ao outro
quando acariciamos nossos smart phones como contas de um rosário, com as
cabeças inclinadas, verificando, monitorando, tweetando. Estamos
ligados; enviamos mensagens; e o tema dominante das mensagens é nós
mesmos. A identidade é o espírito da época. Há muito tempo, em
"Admirável mundo novo", Aldous Huxley previu isto como o meio final de
controle social porque era voluntário, viciante e amortalhado em ilusões
de liberdade pessoal. Talvez a verdade seja que vivemos não numa era de
informação mas numa era dos media. Tal como a memória de Mandela, a
maravilhosa tecnologia dos media foi sequestrada. Desde a BBC até a CNN,
a câmara de eco é vasta.
Ao aceitar o Prémio
Nobel da Literatura em 2005, Harold Pinter falou acerca de uma
"manipulação do poder à escala mundial, se bem que mascarando-o como uma
força para o bem universal, um brilhante, mesmo esperto, acto de
hipnose com grande êxito". Mas, disse Pinter, "isto nunca aconteceu.
Nada alguma vez aconteceu. Mesmo enquanto estava a acontecer não estava a
acontecer. Não importava. Não era de interesse".
Pinter
referia-se aos crimes sistemáticos dos Estados Unidos e a uma censura
não declarada por omissão – isto é, excluir informação crucial que possa
ajudar-nos a dar sentido ao mundo.
Hoje a
democracia liberal está a ser substituída por um sistema no qual o povo
responde a um estado corporativo – não o inverso como deveria ser. Na
Grã-Bretanha, os partidos parlamentares são devotados à mesma doutrina
de cuidar dos ricos e combater os pobres. Esta negação da democracia
real é uma mudança histórica. Eis porque a coragem de Edward Snowden,
Chelsea Manning e Julian Assange é tamanha ameaça para os poderosos e
inimputáveis. E é uma lição para aqueles de nós que pretendem manter as
coisas claras. O grande repórter Claud Cockburn disse isto bem: "Nunca
acredite em qualquer coisa até que seja oficialmente negada".
Imagine
se as mentiras dos governos houvessem sido adequadamente desafiadas e
reveladas quando eles secretamente preparavam-se para invadir o Iraque –
talvez um milhão de pessoas estivesse viva hoje.
[*]
Transcrição da participação de Pilger na edição especial do programa
"Today", da BBC Radio 4, em 2/Janeiro/2014, editada pelo artista e
músico Polly Harvey. Pode ouvir a transcrição acima aqui .
O original encontra-se em johnpilger.com/articles/is-media-just-another-word-for-control
*GilsonSampaio
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