Possível substituta de Feliciano, Érika Kokay diz que Brasil vive ataque contra o Estado Laico
A deputada Érika Kokay (PT-DF), candidata dos movimentos sociais à Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara Foto: Ascom |
Preferida dos movimentos sociais e dos grupos LGBTT para assumir a
cadeira de presidente da Comissão de Direitos Humanos e Minorias (CDHM)
da Câmara dos Deputados, posto que fora ocupado em 2013 pelo polêmico
pastor Marco Feliciano (PSC-SP), a deputada federal Érika Kokay (PT-DF) é
uma das mais ferrenhas defensoras das minorias em Brasília.
Com uma retórica contundente e afiada, ela muitas vezes lembra a
ex-senadora Heloisa Helena pela ferocidade da fala, o destemor na defesa
dos Direitos Humanos e o discurso sempre muito adjetivado, embora com o
tom de voz muitos tons de frequência abaixo da hoje vereadora
alagoana.
Para um desinformado que acompanha pouco o trabalho dos deputados em
Brasília, ao primeiro ouvido é possível confundi-la não como alguém do
partido do governo que está no poder há quase 12 anos, mas como uma
parlamentar dita da “minoria barulhenta”, representada pelos deputados
do PSOL.
Líder do movimento que esvaziou a CDHM no ano passado após embate
fratricida contra o ex-presidente-pastor, acusado de racismo e
homofobia, ela não esconde que é sim, por vontade dos movimentos de
base, candidata à presidência do colegiado, assim como no passado não
escondeu as críticas ao PT, pela legenda ter rifado a presidência do
grupo e entregado aos que ela chama de “fundamentalistas”.
Segundo Kokay, a retomada pelo PT da comissão das minorias é o resgate
de uma dívida do partido com os movimentos sociais e “liberta a
comissão da lógica fascista que a aprisionou” em 2013.
A parlamentar admite erro estratégico do Partido dos Trabalhadores em
ter aberto mão do colegiado ano passado, mas diz que a ação serviu para
escancarar o que chama de “projeto político fundamentalista de poder”,
que foi, segundo ela, “construído de forma subterrânea” e “pressupõe o
rompimento da laicidade do Estado e a hierarquização dos indivíduos”.
“São ovos de serpente. Por isso, retomar a Comissão de Direitos Humanos
significa enfrentar os ovos de serpente, enfrentar uma lógica fascista
que hoje se expressa em vários momentos na sociedade brasileira”,
afirma a parlamentar.
Leia a entrevista completa com Érika Kokay, sindicalista, psicóloga,
ex-bancária e eleita deputada federal pelo PT com 72.651 votos na
última eleição no Distrito Federal:
O que significa a retomada da
presidência da Comissão de Direitos Humanos pelo PT, depois do desastre
da gestão de Marco Feliciano?
A volta do partido liberta a comissão da lógica fascista e
fundamentalista que a aprisionou. Essa retomada é a possibilidade de
voltar a dialogar com o conjunto da sociedade. É importante não só para o
PT, mas também para o Congresso Nacional, para a sociedade e para a
Democracia. Nós não poderíamos permitir que a barbárie continuasse
instalada de forma tão pomposa como se instalou ano passado.
A sra nunca escondeu insatisfação
com o PT por ter permitido a manobra do PMDB que jogou a CDHM nas mãos
dos evangélicos. Foi um erro do partido? O que ficou de lição?
O PT errou. E é obvio que nós aprendemos em 2013 que há um projeto de
governo que está em curso e que foi construído de forma subterrânea e
se expressou de forma contundente na Casa em 2013. Ele pressupõe o
rompimento da laicidade do Estado e a hierarquização dos indivíduos. É
um movimento fascista. São ovos de serpente. Por isso, retomar a
Comissão de Direitos Humanos significa enfrentar os ovos de serpente,
enfrentar uma lógica fascista que hoje se expressa em vários momentos na
sociedade brasileira, lamentavelmente. Seja na crítica contra as
minorias ou na defesa aberta da violência na TV e nas redes sociais.
A intenção do Bolsonaro (PP-RJ) de
assumir a comissão foi real ou mais um factóide dele para chamar a
atenção da mídia e ligar os holofotes em ano eleitoral?
Uma pessoa que defende a Ditadura Militar e as manifestações mais
profundas e violentas da sociedade não deveria nem ter mandato
parlamentar. Porque diversas vezes as posturas do deputado feriram o
decoro parlamentar e feriram a Constituição, que nós dissemos que
iríamos honrar, quando assumimos os nossos mandatos. Mas o deputado
construiu de fato um movimento aliado com os fundamentalistas, que
realmente representou um perigo para a sociedade brasileira. Mas que nós
conseguimos impedir que eles fossem vitoriosos.
Depois desse imbróglio, os
movimentos sociais, especialmente os movimentos LGBTs, querem a sra na
presidência da comissão. Sua candidatura está posta?
Nós vamos apresentar o nosso nome, mas temos a plena convicção de que
qualquer nome que venha do Partido dos Trabalhadores cumprirá a missão
necessária para o fortalecimento dos Direitos Humanos. Nós devemos
fazer uma reunião do Núcleo de Direitos Humanos da Câmara para decidir
quem será o nome. O grupo está reivindicando que um dos seus membros
ocupe a presidência do colegiado. Tem vários nomes colocados além do
meu, como o do Nilmário Miranda ou do Luiz Couto. Todos do PT.
Caso assuma a CDHM, a sra pretende
tomar alguma medida contra o deputado Luis Carlos Heinze (PP-RS), que
chamou índios, gay e quilombolas de “tudo o que não presta”?
A coordenação da Frente Parlamentar de Direitos Humanos já tomou uma
série de posições e vai denunciar a postura do parlamentar no
Ministério Público e na Corregedoria da Câmara, porque a CDHM deve se
oficializar apenas daqui quinze dias, logo depois do Carnaval. Mas essas
declarações dele são inadmissíveis e expressões fascistas que afrontam
a Constituição e a Democracia no Brasil. Elas representam quebra de
decorro parlamentar e não podemos tratar como algo natural. É uma
expressão de barbárie e não tem nada de inocente. É um discurso que afia
as facas, estimulando a violência e a lógica de discriminação que o
Brasil não pode mais suportar e fechar os olhos.
Rodrigo Rodrigues No Terra Magazine
*comtextolivre
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